Ao contrário de outras tempestades, pode ficar muito tempo no mesmo sítio. Em Espanha já fez dezenas de mortos e transformou cidades num autêntico caos
Não, DANA não é mais um nome de uma tempestade. Antes fosse, dirão os espanhóis, que atravessam por estes dias a pior tempestade do século. Os números ainda são provisórios, mas entre o caos de cidades como Valencia ou Málaga – as imagens de um cenário quase apocalíptico dizem tudo – há já 70 mortos e prejuízos incontáveis.
DANA é antes o acrónimo espanhol para depressão isolada em níveis altos, aquilo a que em Portugal chamamos de gota fria, segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), e que é um fenómeno de chuvas torrenciais.
Os espanhóis vão mais longe: também tinham o termo gota fria, mas decidiram criar o termo DANA para distinguir de outras situações de chuva intensa e abundante, especialmente quando estas ocorrem neste contexto específico, uma tempestade de outono na costa mediterrânica.
Como se lê no glossário da Agência Estatal de Meteorologia de Espanha (AEMET), a gota fria surgiu da aglutinação alemã kaltlufttropfen, que na prática significa “gota de ar frio”.
Chuvas fortes provocam inundações em Espanha
Dezenas de pessoas morreram no sudeste de Espanha, informou o governo regional de Valencia na quarta-feira, e as zonas do sudoeste de Espanha continuarão a ser ameaçadas por chuvas fortes até ao final da semana, segundo a agência meteorológica espanhola.
Como mostra o gráfico acima, ou é até visível nas fotografias da galeria associada ao artigo, o grande perigo está na brutal carga de precipitação, que inunda rapidamente ruas de grandes cidades.
Mas Espanha, esclarece a AEMET, entendeu que essa mesma expressão estava a desvirtuar alguns dos fenómenos verificados, nomeadamente a partir dos anos 1980, quando se decidiu cunhar então o termo DANA.
Na prática, este é um “sistema de baixa pressão em níveis altos da atmosfera, que se separou por completo do fluxo zonal em altura”, pode ler-se na AEMET, que indica que é no Hemisfério Norte que se encontram estas tempestades.
🛰️24 horas de #dana a vista de Meteosat de 3ª generación.
Se observan muy bien los núcleos tormentosos de primeras horas en el sur peninsular y cómo, a partir de la mañana, se han ido regenerando una tras otra las tormentas sobre la Comunitat Valenciana y zonas próximas. pic.twitter.com/pbHkxuDef0
— AEMET (@AEMET_Esp) October 29, 2024
Mas como se forma uma DANA?
Para existir uma DANA é necessária uma frente polar, uma corrente de ventos muito intensos (entre os 150 e os 300 quilómetros por hora) que circula na parte alta da atmosfera (normalmente a nove mil metros de altitude) e que afeta sobretudo os sistemas da América do Norte, Europa e Rússia.
Este fenómeno acaba por desencadear ondulações de vento que vão, no espaço de sete a dez dias, provocar autênticas tempestades, anticiclones ou, como neste caso, uma DANA.
Ao contrário de uma tempestade normal, que acaba por passar de forma relativamente rápida, uma DANA pode permanecer no mesmo local durante vários dias ou até mover-se em regressão. Significa isso que pode movimentar-se de forma oposta ao fluxo zonal do oeste. Quer isto dizer que, ao contrário das tempestades comuns, pode movimentar-se de Espanha para Portugal, quando o fluxo normal é o oposto.
Na prática, trata-se de um sistema que se desprende do cinturão de ventos estabelecido na troposfera, baixando assim à estratoesfera. Esta massa de ar frio que desce para níveis mais baixos acaba por gerar precipitação e vento forte.
Em Portugal, e de acordo com as previsões do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), a DANA poderá sentir-se em várias zonas do país. “A partir da tarde de hoje já está emitido aviso para a maior parte dos distritos da região Centro, também para o Porto e a parte mais norte do Alentejo, um aviso amarelo de precipitação entre as 12 de hoje e até à meia-noite de hoje, para aguaceiros, que podem ser por vezes fortes e com também possibilidade de ocorrência de trovoada”, aponta o meteorologista Bruno Café.
Segundo o meteorologista, “para já não se espera que esta situação seja semelhante à de Espanha”, mas o IPMA “vai manter a vigilância”, porque “vamos continuar a ser afetados nos próximos dois dias”, deixando, por isso, um aviso: “a precipitação será com certeza por vezes forte em alguns locais”.
De resto, a própria AEMET frisa que nem sempre uma DANA é significado de uma destruição como a que estamos a assistir em Espanha.