O panorama das drogas está a mudar na Europa, com substâncias sintéticas opiáceas mais potentes, novas misturas de produtos e mudanças nos padrões de consumo, revelam dados do relatório europeu sobre drogas.
Estas mudanças estão a provocar uma ameaça crescente e a aumentar os problemas de saúde pública, conclui o “Relatório Europeu Sobre Drogas 2024 — Tendências e Desenvolvimentos”, divulgado esta terça-feira em Lisboa pelo Observatório Europeu das Drogas e da Toxicodependência (EMCDDA, na sigla em inglês).
Este observatório inicia no dia 2 de julho um novo mandato com poderes reforçados e mais abrangentes, face aos novos desafios que têm surgido na área do tráfico, do consumo e novas substâncias.
O documento, que apresenta dados do ano anterior dos 27 Estados-membros da União Europeia (UE), Turquia e Noruega, sublinha que os consumidores estão mais expostos a “uma gama mais vasta” de substâncias psicoativas, “muitas vezes de elevada potência ou pureza, ou em novas formas, misturas e combinações”.
“Com produtos mal vendidos (muitas vezes pela Internet e com substâncias adulteradas), os consumidores podem não ter a consciência do que estão a consumir e ficarem sujeitos a maiores riscos para a saúde, incluindo envenenamento potencialmente fatal”.
É o caso da heroína, que continua a ser o opiáceo mais consumido na Europa e responsável por “parte significativa” dos problemas de saúde, sendo o mercado europeu “cada vez mais complexo”, com uma variedade de substâncias sintéticas que estão a causar preocupação.
O relatório destaca preocupações em torno dos opiáceos sintéticos potentes, por vezes vendidos indevidamente ou misturados com medicamentos e outras drogas, assim como MDMA (ecstasy) adulterado com catinonas (estimulantes) sintéticas e produtos de canábis adulterados com canabinóides sintéticos.
Todos os anos surgem novos opiáceos sintéticos
No final de 2023, o EMCDDA monitorizava mais de 950 novas substâncias psicoativas, 26 das quais notificadas pela primeira vez na Europa nesse ano.
Uma mensagem do relatório deste ano vai para os policonsumos: duas ou mais substâncias psicoativas ao mesmo tempo ou em sequência, muitas vezes misturada com álcool.
O problema crescente dos opiáceos na Europa aparece com uma “ameaça emergente” denominada nitazenos (opioide sintético 40 vezes mais forte do que o fentanil e 140 vezes mais poderoso do que a morfina), que se expandiu por todo o mundo e que terá causado nos últimos quatro anos mais de 200 mortes.
Desde 2009, surgiram no mercado europeu de droga 81 novos opiáceos sintéticos, altamente potentes e com um enorme risco de envenenamento e morte por overdose.
Em 2023, seis dos sete novos opiáceos sintéticos notificados pela primeira vez ao Sistema de Alerta Rápido da UE eram nitazenos, o maior número desta substância notificado num ano.
O relatório alerta que a Europa tem de melhorar a sua preparação para eventuais mudanças de mercado, garantindo prevenção e tratamento adequados, incluindo o acesso a medicamentos e a serviços de redução de danos, bem como disponibilizando fornecimentos de naloxona, o medicamento para reversão de overdoses.
Canábis continua a droga mais consumida
Já a canábis continua a ser o estupefaciente mais consumido na Europa.
Segundo dados do mesmo relatório, a canábis foi consumida por 22,8 milhões (8%) com idades entre os 15 e os 64 anos, número que aumenta para 85,4 milhões de pessoas (29,9%) ao longo da vida.
A cocaína, a segunda droga ilícita mais consumida, foi usada no último ano por quatro milhões (1,4%) pelo mesmo grupo etário, aumentando para 15,4 milhões (5,4%) ao longo da vida.
No que se refere aos comprimidos de MDMA (ecstasy), os números apontam para 2,9 milhões (1%) na casa dos 15 aos 65 anos, subindo para 12,3 milhões (4,3%) que responderam sobre consumos ao longo da vida.
As anfetaminas foram usadas no último ano por 2,3 milhões (0,8%) de adultos entre os 15 e os 64 anos, subindo para 10,3 milhões (3,6%) ao longo da vida.
A heroína (o opiáceo ilícito mais consumido na Europa) e outros opiáceos sintéticos foram usados por 860 mil consumidores de alto risco, que o relatório não especifica que idades abrange.
Em 2022, 513 mil utilizadores estiveram em tratamento de substituição opiácea, sendo esta a droga que representa cerca de 24% dos pedidos de tratamento na UE. A mesma droga é encontrada em 74% dos casos de morte por overdose.