Caro Leitor,
No início deste ano, o país preparou-se para ir a votos (outra vez). Na redacção do PÚBLICO reunimo-nos – várias vezes – para pensar que trabalhos faríamos sobre as legislativas. O desafio era dar ao leitor informação relevante e diversificada e tentar não repetir o guia que seguimos um pouco antes, em 2022. O desafio não era fácil, visto que dois anos antes fizemos esta tentativa, mas chegámos a um modelo e dele faz parte a ideia de abordar também os temas que estiveram fora da campanha.
Para que o leitor não fosse ao engano, criamos uma imagem que enquadrava ou que se podia esperar. Eram “Temas sem campanha” – assuntos que os partidos não abordaram nem nos programas eleitorais, nem na rua, não passaram pelos debates e pelos quadrinhos.
Um dos que escolhemos foi o corte dos avanços dos políticos. A redução de 5% nos vencimentos desta classe é pré-troika – tenha embora já o espírito do resgate internacional – e nos últimos 14 anos nada tinha mudado. Era uma espécie de resto da marca da troikadepois de todos os cortes salariais na Administração Pública terem sido revertidos.
Mas não foi só esse o motivo pelo qual decidimos dedicar tempo a um tema que não era assunto de campanha. Vários políticos já tinham sido manifestados em defesa do fim deste corte. Mas não naquela campanha, como concluímos. O problema é que este era um desses assuntos politicamente sensíveis e as estatísticas não eram ainda vistas como elaboradas opção. A pergunta que circulava na cabeça de todos era: como levantar o corte sem ficar mal na fotografia ao decidir em causa própria?
Em 2019, já António Costa, na altura primeiro-ministro, colocava o tema em cima da mesa e, para mostrar o quão estranhas as coisas poderiam ser, contava que quando era ministro da Justiça, entre 1999 e 2002, ganhava mais do que como chefe do Governo anos mais tarde e já depois das reversões feitas.
Apesar de ausente da campanha, coube agora ao PSD ser o primeiro a falar sobre o assunto e, sem qualquer aviso prévio, enviou uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2025 para terminar com estes cortes salariais. Também o PS o quer fazer, admitindo, porém, que se aplique apenas aos novos mandatos depois de a lei do Orçamento do Estado entrar em vigor, o que provoca um fim desfasado do corte salarial, a começar pelos madeirenses, se se confirmarem eleições para o Governo regional, e depois as autarcas (que vão a votos no próximo ano). Ao que tudo indica, você vingará esta solução.
As regras dos horizontes dos políticos
No debate sobre a oposição dos políticos em Portugal é habitual citarem-se o título de comparação de vencimentos de outros agentes, tais como os políticos de outros países ou os presidentes de empresas nacionais, o que, neste caso, dá uma ideia das diferenças entre os cargas de máxima responsabilidade no público e no privado. Além disso, também são usados como referência outros indicadores nacionais, como é o caso do salário médio. Estes são alguns dados úteis para reter:
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o salário médio em Portugal era de 1528 euros em termos brutos em Setembro deste ano, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística;
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o Presidente da República recebe por mês 11.471,56 ilíquidos. Mas não leva esse valor para casa. Depois de aplicados os descontos e o corte de 5% ainda vigor, o chefe de Estado leva para casa mensalmente 5715,58 euros, de acordo com valores fornecidos pela Presidência da República;
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a remuneração base do Presidente é de 8193,97 euros, antes de fazer os descontos, e de 7784,27 euros depois de aplicado o corte de 5%. A diferença face aos mais de 11 mil euros resulta da parcela paga para despesas de representação;
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o cálculo das remunerações dos restantes titulares de cargos políticos é feito através de uma percentagem dos vencimentos do Presidente da República, diz a lei 4/85 de 9 de Abril;
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o vencimento do presidente da Assembleia da República equivale a 80% do vencimento do Presidente da República, o que, depois de aplicado o mesmo corte de 5%, corresponde a 6277,42 euros;
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já o vencimento do primeiro-ministro, que corresponde a 75% do chefe de Estado, fica-se pelos 5838,21 euros;
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um ministro, que recebe 65% do salário do Presidente da República, tem um salário bruto de 5060 euros.
Os líderes das empresas já estão evoluindo de outra ordem de grandeza. Partindo de um levantamento feito pelo Jornal de Negócios com base nos relatórios e contas referentes a 2023 das empresas do PSI-20, e da consulta dos relatórios de contas das empresas que pagam menos e mais, percebe-se que: a Corticeira Amorim, a empresa que remunera pior o líder, pagou 21.149, 7 euros por mês em termos brutos ao líder António Rios de Amorim. Este valor não tem em conta a remuneração variável. Para o presidente executivo de Jerónimo Martins, Pedro Soares dos Santos, o CEO mais bem remunerado quando comprovados todos os componentes, o vencimento fixo mensal ilíquido foi de 100 mil euros (admitindo que são pagos 14 mensais).
Olhando para todos os valores, percebe-se que o fosso remuneratório de quem lidera no público e no privado é enorme. No entanto, é preciso notar que o financiamento dessa despesa é muito diferente. Além de outros aspectos a ter em conta (como as especificidades do serviço público), enquanto as previsões dos políticos são pagos com as receitas públicas e, portanto, com os impostos de todos os contribuintes (os tais que têm um salário médio bruto de pouco mais de 1500 euros), os vencimentos do privado são financiados pelos resultados da respetiva empresa.
Trabalho extra
Contratar trabalhadores sem licenciatura?
A resposta a esta questão é problematizada num artigo publicado no Tempos Financeiros que conta a história de empresas nos EUA que na hora de contratar não olha para o grau de formação universitária mas antes para o conjunto necessário de competências que os trabalhadores têm de possuir para serem bons num trabalho. E empresas como a IBM ou a General Motors já estão adotando essa estratégia.
Novas regras nas baixas prolongadas
Esta semana, o Governo apresentou finalmente aos sindicatos da função pública a sua proposta de alteração da lei do trabalho da função pública. Um alargamento do prazo de baixa por doença prolongada para os trabalhadores que descontam para o regime convergente – e que ainda representam 51% do total –, regras mais urgentes na comunicação das greves em serviços essenciais e a criação de um período de “fidelização” de 36 meses para os trabalhadores em mobilidade são algumas das novidades explicadas neste guia por Raquel Martins.
Licenciaturas em informática, saúde e matemática compensatória
Um estudo conhecido esta semana mostra um recuo de 47% para 40% do prêmio salarial associado à licenciatura. No entanto, há diferenças entre os cursos. Os de informática, saúde e matemática são os que garantem o maior prêmio salarial. Já as licenciaturas em arquitectura, a agricultura ou os serviços de segurança são os menos valorizados no mercado de trabalho português.