O novo Plano de Ação para as Doenças Raras 2025-2030, que esteve em consulta pública no passado mês de novembro, não pode ser apenas mais um documento administrativo ou carta de interesse. Representa uma oportunidade fundamental de transformar a realidade de milhares de portugueses que vivem no limbo das condições médicas complexas e incompreendidas. Mais do que um plano, trata-se de um compromisso moral com cidadãos frequentemente invisíveis em sistemas de saúde.
A sua implementação exigiu algo que historicamente tem sido escasso no panorama político nacional: compromisso sustentado e verdadeiramente transversal. Não basta a existência de um documento técnico muito bem elaborado; É fundamental garantir que os principais partidos políticos assumam este plano como uma prioridade nacional, independentemente de alternâncias governativas.
A criação da Coordenação Intersetorial para as Doenças Raras configura um avanço promissor, mas representa apenas o primeiro passo de uma jornada complexa. É absolutamente crítico que esta coordenação não se transforme num mero exercício burocrático, mas funcione como um organismo verdadeiramente operacional, com poderes claros de monitorização, auditoria e intervenção.
O financiamento surge também como outro elemento nevrálgico. Um plano sem recursos adequados é pouco mais que uma declaração de interesse. É fundamental estabelecer um modelo orçamental transparente, com mecanismos rigorosos de gestão e aplicação de verbos, permitindo que cada euro investido tenha um impacto mensurável na vida dos pacientes e das suas famílias.
O acompanhamento integral das pessoas com doença rara constitui outro aspecto determinante. Falamos de um percurso que deve ser holístico: desde o diagnóstico inicial (nem sempre fácil e atempado), passando pela monitorização de técnicas inovadoras, até à avaliação contínua da qualidade de vida. Este acompanhamento não pode ser fragmentado ou dependente de iniciativas individuais, mas estruturado como um direito efetivo.
O envolvimento multissetorial emerge assim como condição condição sine qua non para o sucesso. Significa integrar não apenas entidades públicas como os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, Direção Geral da Saúde e Infarmed, mas também associações de pacientes e cuidadores, universidades, sociedade civil e empresas de biotecnologia. Só um ecossistema verdadeiramente colaborativo poderá responder à complexidade das doenças raras.
Mais do que um plano técnico, estamos diante de um design ético. Trata-se de considerar a dignidade de cidadãos que frequentemente vivem à margem dos sistemas convencionais, transportando para a esfera pública uma responsabilidade coletiva de cuidado e inclusão.
O momento é agora. A expectativa da sociedade portuguesa é clara: queremos ver este plano transformado em ação concreta, em resultados mensuráveis, em qualidade de vida real para quem mais precisa. Não podemos – nem devemos – fracassar (outra vez) uma oportunidade histórica de construir um sistema de saúde mais justo, mais humano e verdadeiramente inclusivo.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico