Os preços das casas em Portugal cresceram 83% em termos reais entre o início de 2013 e o final de 2023, bem acima do crescimento de 28% em Espanha no mesmo período. A conclusão é de um estudo publicado na Revista de Estudos Económicos do Banco de Portugal (BdP), que indica que os sinais de sobrevalorização do mercado imobiliário residencial em Portugal persistem desde o início de 2017.
“Em Portugal, os preços apresentavam sinais de sobrevalorização no final de 2023, enquanto este comportamento não se observa no mercado espanhol”, destacam os economistas Rita Fradique Lourenço, Afonso Moura e Paulo Rodrigues, no artigo “Mercado imobiliário em Portugal e Espanha: Fundamentos, sobrevalorização e choques”, que integra a revista do supervisor bancário de outubro.
No entanto, esse comportamento vem de longa data. “Os sinais de sobrevalorização dos preços da habitação em Portugal persistem desde o início de 2017, em contraste com o comportamento dos preços no mercado espanhol”, acrescentam.
Os autores recordam que, nos últimos anos, Portugal e Espanha enfrentaram crises financeiras e processos de ajustamento semelhantes e que os preços da habitação em ambos os países registaram contração, embora com magnitude diferente. Assim, entre a crise financeira de 2008 e 2013, os preços caíram, em média (em termos reais), 4% ao ano em Portugal e mais de 8% em Espanha.
De 2014 a 2023, os preços das casas registaram uma recuperação que atingiu um crescimento médio anual de 6% em Portugal e inferior a 3% em Espanha.
“O crescimento dos preços da habitação em Portugal é, na maior parte do período considerado, impulsionado pelas forças da procura, não sendo a oferta capaz de contrabalançar este efeito. No caso espanhol, esta pressão da procura é mitigada pelo contributo da oferta, nomeadamente no período pré-pandemia”.
Do início de 2020 até ao final de 2023, no caso português, por exemplo, registou-se um abrandamento do investimento residencial durante a pandemia, seguido de uma “forte recuperação (novamente, impulsionada sobretudo pela procura) no ano de 2021”. Posteriormente, desde meados de 2022, o início do ciclo de política monetária restritiva iniciado pelo Banco Central Europeu (BCE) levou a um abrandamento tanto do investimento como dos preços, “embora no final de 2023, estes últimos já estejam a retomar uma trajetória de aceleração — guiados novamente pela pressão vinda da demanda”.
Por outro lado, “em Espanha, desde o período pandémico, os preços cresceram abaixo ou dentro da média histórica”, uma vez que “inicialmente, as restrições de oferta pressionaram ligeiramente os preços para a aceleração, mas a fraca procura contrabalançou esta tendência”. No período mais recente, “nem a procura nem a oferta criaram uma pressão considerável sobre os preços”, consideram.
Em 2023, o preço mediano do alojamento familiar em Portugal era de 1.611 euros/m2, sendo as sub-regiões Grande Lisboa (2.740 euros/m2), Algarve (2.613 euros/m2), Península de Setúbal (1.901 euros/m2), Autónoma Região da Madeira (1.889 euros/m2) e Área Metropolitana do Porto (1.800 euros/m2) registaram valores superiores ao valor nacional, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). A informação mais recente, divulgada em outubro, indica que no segundo trimestre deste ano, o preço mediano das casas familiares em Portugal foi de 1.736 euros/m2, refletindo um aumento de 6,6% face ao segundo trimestre de 2023.
Segundo dados do organismo estatístico, em 2023, cerca de 2/3 da despesa média das famílias em Portugal concentrou-se nos custos associados à habitação (39,3%).
Instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI) também alertaram para a deterioração do acesso à habitação em Portugal. “A acessibilidade da habitação deteriorou-se significativamente ao longo da última década”, afirmou a agência em Outubro, observando que “os pagamentos médios de hipotecas representam agora 32,8% do rendimento médio, contra 23,8% há quatro anos”.
O FMI salienta que “uma família com um rendimento mediano deixará de ser elegível para um empréstimo hipotecário para adquirir uma casa com preço mediano em 2023, ao contrário do que aconteceu no passado recente”, notando ainda que, “refletindo a rápida subida nos preços da habitação, no segundo trimestre de 2023, era necessário 1,5 vezes o rendimento médio para obter uma hipoteca para uma casa com preço médio.”
Do lado da oferta, argumentam que é “essencial resolver a escassez de oferta de habitação local para corresponder à procura das famílias”. Para tal, recomenda “ações necessárias para reduzir as barreiras regulamentares e administrativas e resolver a questão da escassez de mão-de-obra no setor da construção”. E elogia algumas medidas recentes do Governo, como o programa “Construir Portugal”, que “pode ajudar a resolver algumas das causas fundamentais da escassez de habitação se tiver sucesso na redução das barreiras regulatórias à construção”.