Domingo, Novembro 24

Numa audição com momentos de tensão política, o coordenador da Comissão de Trabalhadores (CT) do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), Rui Gonçalves, explicou esta quinta-feira, 21 de Novembro, na Comissão Parlamentar de Saúde que há um recurso enorme às horas extraordinárias no instituto onde trabalha, mas que muitos ficam por pagar, fazendo com que haja profissionais a fazer trabalhos de borla para o instituto.

Uma troca de acusações entre o PSD e o PS marcou o início da intervenção dos deputados dos diferentes grupos parlamentares, obrigando Ana Abrunhosa, presidente da Comissão Parlamentar de Saúde, a tentar irritar os ânimos. A social-democrata Sandra Pereira referiu-se aos ex-ministros da Saúde Marta Temido e Manuel Pizarro e ao ex-ministro das Finanças, Fernando Medina, como “co-responsáveis ​​pela situação” actual do INEM. Agora, diz, “sob este Governo, o debate mudou”.

Do PS, Sofia Andrade não tardou na resposta, acusando o PSD de utilizar “uma narrativa assente em inverdades”. A socialista garante que o partido “nunca disse que os problemas surgiram agora” e lançou uma série de medidas inovadoras pelo Governo socialista onde, entre outras, foi “aumentada a pagamentos” dos técnicos de emergência pré-hospitalar. Quanto ao actual executivo, Sofia Andrade sustentou que “governar não é o que este ministério tem feito”, uma vez que, “com conhecimento de uma greve com 20 dias de antecedência, nada fez”.

À margem do clima de tensão política, Rui Gonçalves, ele próprio técnico de emergência do INEM, falou na dependência de que o instituto tem horas extraordinárias para fazer face ao dia-a-dia, apesar de, por determinação legal, o organismo não poder pagar as horas extraordinárias em montantes que ultrapassem os 60% do salário base. No Verão passado, o Ministério da Saúde autorizou que, durante alguns meses, o limite de subisse para 80%, de forma a incentivar a realização de horas extra numa altura típica de férias. “Só no mês de Setembro foram contabilizadas 28 mil horas extras, mas este número não estão contabilizadas milhares de horas feitas pelos técnicos acima do limite dos 60% ou 80% [do salário base]”, precisou Rui Gonçalves.

O coordenador da CT do INEM denuncia o desinvestimento que se sente no instituto há uma década, lamentando a falta de recursos humanos em todas as carreiras, desde os técnicos de emergência até aos médicos, e a falta de atractividade das respectivas carreiras. “Como o que ganhar é praticamente impossível reter técnicos de emergência. Também os médicos sem acesso à ocupação ficam plenos num vazio”, referiu Rui Gonçalves. O coordenador da CT realçou também a falta de investimento material no instituto, nomeadamente nas viaturas médicas de emergência e reanimação, e o desinvestimento nas novas tecnologias que não permitem o INEM evoluir.

Sobre a chamada “refundação” do instituto prometida pela ministra da Saúde, Rui Gonçalves disse não saber o que tal significa, mas disse esperar que represente um regresso às fundações do INEM, onde está prevista a autonomia administrativa e financeira. “Ao longo dos últimos anos foram subtraídos 135 milhões ao orçamento do INEM, o que equivale a um ano inteiro de orçamento”, constatou o profissional. Rui Gonçalves falou ainda na dificuldade em recrutar quadros para a zona de Lisboa face ao elevado preço da habitação, o que acaba por levar os trabalhadores a abandonar os seus lugares. “São problemas que precisam de soluções”, afirmou.

A deputada Sandra Pereira, do PSD, conclui que “fica claro que há, de facto, um desinvestimento crónico no INEM” e que, caso não tenham sido desviados 135 milhões de euros, o instituto “seria muito melhor do que é actualmente”. A socialista Sofia Andrade reagiu pouco depois, considerando que um número de 135 milhões foi utilizado para “combater uma altura extraordinária da nossa vida”, referindo-se à pandemia. Entendemos, por isso, que este argumento é utilizado com “má-fé”.

Mário Amorim Lopes, da Iniciativa Liberal (IL), respondeu à deputada socialista dizendo que “a pandemia não pode servir para tudo” e que “a missão do INEM não é atender a problemas de saúde pública”. As afirmações do deputado foram bastante contestadas pelos deputados socialistas, que tinham os microfones desligados. “Com esta nota de que as pandemias não são urgências nem emergências médicas, não tenho nenhuma questão a exigência”, reagiu, por seu lado, Marisa Matias, do Bloco de Esquerda.

Tentando responder às dúvidas dos deputados, Rui Gonçalves afirma que o sistema de emergência está bem estruturado, necessitando apenas de um reforço de recursos humanos e materiais. No entanto, admitiu que o instituto está a garantir serviços que não fazem parte das suas funções. Nesse âmbito, Rui Gonçalves criticou o uso que algumas unidades de saúde fazem do instituto para transportar doentes entre hospitais, evitando desta forma contratar estes serviços a outras entidades. “É muito fácil ligar para o CODU [Centro de Orientação de Doentes Urgentes] e pedir o transporte. Mas isso faz com que os meios cheguem horas sem poder responder a situações de verdadeiro socorro”, destacou.

O coordenador da CT do INEM lamentou que o instituto esteja “desligado da rede de urgências”, o que faz com que, por vezes, quando chegam a um hospital tenham de se submeter à triagem como qualquer outro usuário. “Em alguns hospitais até temos de tirar uma senha para fazer a triagem”, exemplificou. Tal faz com que muitas vezes a passagem dos doentes das ambulâncias do INEM para que as urgências hospitalares se prolonguem, ficando esses meios indisponíveis para responder a outras situações de socorro.

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