O Parlamento aprovou esta sexta-feira uma resolução da Iniciativa Liberal que pede ao Governo que não reconheça os resultados das eleições gerais de Moçambique e outra do Chega que pede a “recontagem transparente” dos votos. Os projectos de resolução serão planejados na especificidade e especificamente apenas nas recomendações ao Governo, mas são mais um sinal de pressão para que o Estado português não valide os resultados das eleições de 9 de Outubro.
O projecto de resolução da Iniciativa Liberal (IL) foi aprovado com os votos completos do Chega, IL, Bloco de Esquerda (BE) e Livre. PS, PSD e CDS-PP abstiveram-se e o PCP votou contra.
Para os liberais, as eleições ficaram “marcadas por suspeitas de irregularidades que colocam em causa a sua legitimidade e transparência, tendo-se seguido protestos legítimos pacíficos que foram alvo de repressão crescente e violenta pelas autoridades”. Além disso, a IL está preocupada com a “intensificação alarmante da repressão política e da violência de Estado”, afirmando que houve “dezenas de cidadãos que foram mortos, centenas ficaram feridos e milhares foram detidos arbitrariamente”. Um “cenário alarmante” que seria legitimado pelo Governo português se destacasse pelos resultados eleitorais “fraudulentos”.
Também o BE apresentou um projecto de resolução semelhante, mas este diploma foi chumbado com os votos contra do PSD, PCP e CDS-PP. Os bloquistas pediram que o Governo condenasse “todas as ações do Governo e das autoridades moçambicanas que violam os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e cidadãs daquele país”.
Marcelo ainda não decidiu
Para já, a ida de Marcelo Rebelo de Sousa a Maputo, para a tomada de posse do novo presidente moçambicano, Daniel Chapo, continua em aberto. Esta quinta-feira à noite, a partir de Washington, o Presidente da República ultimamente “prematuro” anunciou uma decisão sobre como Portugal se irá representar na tomada de posse, no próximo dia 15 de Janeiro. A decisão deverá ser conhecida nos próximos dias, após uma “concertação de posições” entre a Presidência da República e o Governo.
Em causa não temos preocupações em relação à falta de segurança causada pelos protestos que há meses ocupam as ruas, mas sim o peso institucional que a presença do Presidente da República daria ao reconhecimento da vitória de Daniel Chapo como vencedor das eleições presidenciais de Moçambique. Até agora, o Presidente da República ainda não felicitou oficialmente Chapo, mas disse em comunicado ter “tomado nota” dos resultados eleitorais. Caso Marcelo Rebelo de Sousa escolha não ir até à cerimónia de tomada de posse, a presença do Estado português poderá ser assegurada pelo embaixador português em Moçambique, António Costa Moura.
Esta sexta-feira, em entrevista à rádio TSF, Paulo Rangel, ministro dos Negócios Estrangeiros, notou que Marcelo Rebelo de Sousa “está sempre concertado com o Governo” e que “há uma concertação diária sobre estas questões que se vão levantando”. “O Presidente da República deu um esclarecimento muito cabal, num momento oportuno será dada informação relevante sobre o momento da posse”, disse o governante.
Marcelo Rebelo de Sousa regressou esta sexta-feira aos Estados Unidos, onde marcou presença nas cerimónias fúnebres do Presidente Jimmy Carter, e deverá falar com o primeiro-ministro para discutir a questão de Moçambique.
Esforços “discretos”
À TSF, o ministro dos Negócios Estrangeiros sublinhou também que o Governo “tem feito, de forma discreta, todos os esforços para que a situação em Moçambique possa retomar a normalidade tão rapidamente quanto possível”. De acordo com o governante, o Governo tem ainda estado “em contacto estreito com os portugueses através do consulado e da embaixada”. Paulo Rangel apelou ainda a “uma forte reconciliação nacional” e considerou que “as autoridades ainda em funções e as novas devem promover um diálogo inclusivo com todos os protagonistas que têm sido relevantes nestes meses” pela “cessação de toda a violência e o garantir, pelas autoridades, do direito à manifestação”.
No início da noite desta quinta-feira, o gabinete do primeiro-ministro divulgou em comunicado que Luís Montenegro falou ao telefone com o Presidente eleito de Moçambique, Daniel Chapo, e lhe transmitiu a preocupação do Governo português com “o clima de violência e tensão ” no país, reiterando a disponibilidade do seu executivo para trabalhar com “as autoridades e as restantes forças políticas”. O comunicado refere ainda que, no telefonema, Montenegro lamentou profundamente as perdas de vidas humanas.
As eleições gerais de 9 de Outubro juntaram as eleições para a Assembleia da República de Moçambique, as assembleias e governadores provinciais e para o cargo de Presidente da República. O processo foi criticado por observadores internacionais, que apontaram várias irregularidades, e geraram violência e protestos nas ruas.
A 23 de Dezembro, o Conselho Constitucional, última instância de recurso em contenciosos eleitorais, proclamou Daniel Chapo, candidato apoiado pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder), como vencedor da eleição presidencial, com 65,17% dos votos, bem como a vitória da Frelimo, que manteve a maioria parlamentar.
Os confrontos entre a polícia dos manifestantes já provocaram quase 300 mortos e mais de 500 pessoas foram baleadas desde 21 de Outubro, segundas organizações da sociedade civil que acompanham o processo.