Domingo, Setembro 22

Afinal qual é o problema com os painéis publicitários digitais de grande formato em Lisboa? O tema que tem tido vários desenvolvimentos nos últimos dias, por isso, fazemos o ponto de situação

Nas últimas semanas, os novos painéis publicitários digitais têm vindo a marcar a agenda mediática. A 6 de setembro, a CNN Portugal noticiou que estas novas estruturas publicitárias eram um “problema” de segurança rodoviária que “dificilmente pode ser legal” e desde então existiu um troca de culpas entre o executivo de Carlos Moedas e a oposição autárquica. Neste artigo propomo-nos a explicar-lhe tudo que aconteceu nos últimos dias.

Porque são os painéis um risco para a Segurança Rodoviária que viola o Código da Estrada?

Todos os especialistas em Segurança Rodoviária e em Direito Rodoviário contactados pela CNN Portugal têm sido unânimes ao salientar que estes painéis constituem um novo risco para os condutores da capital. Como explicou a ACP, estes ecrãs de grandes dimensões estão “demasiado próximos da via, eventualmente, com conteúdos e mensagens que não são controlados e podem constituir um fator de distração muito forte para o condutor”.

Assim sendo, como explicou o presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados, “dificilmente se poderá afirmar que são legais”, justificando que são uma violação do Artigo 5.º do Código da Estrada, que proíbe a instalação “nas vias públicas ou nas suas proximidades de quadros, painéis, anúncios, cartazes, focos luminosos, inscrições ou outros meios de publicidade capazes de perturbar a atenção do condutor, prejudicando a segurança da condução”.

No entendimento de José Rocha, advogado especialista em Direito Rodoviária, estes novos painéis vão ainda contra o Artigo 3.º, em que se pode ler que “as pessoas devem abster-se de atos que impeçam ou embaracem o trânsito ou comprometam a segurança, a visibilidade ou a comodidade dos utilizadores das vias, tendo em especial atenção os utilizadores vulneráveis”.

Em caso de acidente, a Câmara Municipal pode ser responsabilizada?

Quatro advogados com experiência alargada em casos de acidentes de viação garantiram à CNN Portugal que a autarquia poderia ter de pagar indemnizações aos condutores lesados, mas, para isso, é necessário que se prove “o nexo de causalidade com a colocação destes painéis, que criaram uma perturbação no condutor, na sua condição e uma desatenção”, como explicou José Rocha.

O advogado Tiago Coluna alertou, no entanto, que é de “difícil produção de prova que aponte para que a responsabilidade de um acidente rodoviário se deve imputar a alguém que não seja o condutor”. E Ricardo Lucas e João Maia de Oliveira admitiram a possibilidade de perante um acidente haver uma “situação de concorrência de culpas”, explicando que dificilmente poderá existir um caso em que a imputação total e culpa recaiam sobre a CML: “As Câmaras muito raramente são responsabilizadas”, explicou Ricardo Lucas, lembrando ainda que estes processos são decididos nos tribunais administrativos e podem “demorar cerca de dez anos”.

Quem deu o aval aos painéis?

Primeiro foram as paragens de autocarro sem luz e agora os painéis publicitários LED de grande dimensão: são duas polémicas distintas, mas em comum têm o mesmo contrato para a concessão da exploração publicitária da cidade, assinado entre a Câmara Municipal de Lisboa (CML) e a empresa JCDecaux, após concurso público que vai render aos cofres da capital 8,3 milhões de euros anuais, durante 15 anos.

O processo foi iniciado em 2016 com Fernando Medina, mas o contrato assinado em 2022 já com Moedas. Pelo meio, sucederam-se impugnações, retificações e até idas a tribunal e, no fim, sobraram dúvidas, receios e trocas de acusações. A equipa de Carlos Moedas garante que foi o seu antecessor Fernando Medina quem decidiu a localização e o formato dos painéis. Já os socialistas atiram as responsabilidades para o atual presidente, acusando-o de estar a tomar opções que podem comprometer “a segurança rodoviária” na capital do país ao avançar para mupis com dimensão “excessiva”.

Comunicações a que a CNN Portugal, a 11 de setembro, teve acesso mostram que as localizações dos 125 painéis de grande formato foram apresentadas pela JCDecaux e, posteriormente, aprovadas pelo executivo autárquico de Carlos, que, no entendo, refere que estava “refém” do contrato original de autoria socialista.

Que entidades deram parecer positivo á colocação dos painéis?

A 11 de setembro, os vereadores do PS emitiram um comunicado em que dizem que “ficou claro” que “o executivo de Carlos Moedas aprovou a colocação dos painéis publicitários de grandes dimensões, em áreas sensíveis da cidade, sem ter pedido parecer ou avaliação às entidades competentes na área da segurança rodoviária”.

Anteriormente a CNN Portugal, já havia questionado as entidades nacionais responsáveis pela Segurança Rodoviária. A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária nunca respondeu às questões. O Instituto de Mobilidade e dos Transportes (IMT) assegurou que “não tem interferência nesta matéria”. E a Infraestruturas de Portugal (IP) explicou que este só seria um tema da sua jurisdição caso tivesse ocorrido numa estrada pertencente à Rede Nacional Rodoviária, da qual não fazem partes estradas municipais como a 2.ª Circular.

Questionado pelo deputado municipal do PEV José Sobreda Antunes sobre a “proliferação dos painéis publicitários” e os alertas do perigo em termos de segurança rodoviária, considerando que “este executivo é meramente reativo”, na terça-feira, Carlos Moedas informou que foi pedido um parecer ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) para a instalação dos painéis publicitários de grande formato. Contudo, como noticiou o Expresso, o IMT indicou que não possui tal competência e remeteu o pedido para a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR).

Quem se opõe à presença destes painéis em certos troços de Lisboa?

O Automóvel Club de Portugal (ACP) avançou, no dia 9 de setembro, com uma providência cautelar contra a Câmara Municipal de Lisboa e as empresas JC Decaux e MOP (Multimedia Outdoors Portugal) com o objetivo de desligar e não permitir novas instalações de painéis publicitários LED de grande formato que, no seu entender, são um perigo para a Segurança Rodoviária.

À CNN Portugal, o presidente do ACP explica que o objetivo “não é proibir, obviamente, a publicidade digital, mas que se possa desligar os painéis que são efetivamente um exagero e que são prejudiciais para a segurança rodoviária”. Carlos Barbosa garante que em determinadas zonas da capital, como por exemplo na 2.ª Circular, “não faz sentido a loucura dos painéis”: “Os monstros dos painéis e a chapa de luz que aquilo tem são altamente perigosos”, lembrando que o próprio Código da Estrada “proíbe que haja painéis assim tão perto das vias como estão”.

Para além da ACP, o PS exigiu “a retirada de publicidade que afete a segurança e o descanso em Lisboa” e “sejam solicitados com a máxima urgência todos os pareceres indispensáveis para a colocação destes painéis publicitários”.

Também PCP, BE e PEV manifestaram preocupações e pediram pareceres quanto à localização destes painéis. À CNN Portugal, a deputada municipal bloquista Maria Escaja anunciou que o partido vai solicitar ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil uma auditoria independente à localização dos painéis publicitários.

Maria Escaja argumenta ainda que “é absurdo que os painéis estejam ligados dia e noite”, lembrando que “a maioria das cidades europeias já desliga estes painéis durante a noite” e que “é ridículo que estejam a ser colocados em sítios onde podem efetivamente provocar acidentes”.

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