Quarta-feira, Dezembro 18

No entanto, ao estabelecerem-se em território português, muitos destes residentes estrangeiros deparam-se com uma realidade que poderão não ter considerado anteriormente: a aplicação do direito sucessório português aos seus bens.

De acordo com a lei portuguesa, a sucessão rege-se pela lei do domicílio do falecido no momento da sua morte. Neste contexto, “domicílio” refere-se ao local onde a pessoa tinha a sua residência habitual. Para a maioria dos estrangeiros com residência legal em Portugal (autorização de residência), isto significa que se falecerem enquanto residiam em Portugal, todos os seus bens serão regidos pela lei portuguesa.

O direito sucessório português caracteriza-se pela proteção da família do falecido, nomeadamente dos herdeiros legítimos, como cônjuges, descendentes e ascendentes. Este sistema de “herança forçada” garante que, pelo menos, dois terços dos bens devem ser atribuídos a estes herdeiros, independentemente de quaisquer disposições testamentárias deixadas pelo falecido. Ou seja, não é possível ceder a totalidade dos bens a terceiros, como amigos ou instituições de caridade, sem considerar os direitos dos herdeiros legítimos.

Para muitos estrangeiros, especialmente os provenientes de países com leis sucessórias mais flexíveis ou baseadas no princípio da liberdade de disposição, a aplicação da lei sucessória portuguesa pode constituir uma surpresa indesejável. Estes indivíduos podem pretender distribuir os seus bens de forma diferente, favorecendo determinadas pessoas ou instituições, algo que não é livremente permitido pelo regime português. Além disso, surge uma complexidade adicional quando o património envolve ativos localizados em vários países, aumentando os desafios na gestão e execução da sucessão.

Considerando este cenário, é crucial que os estrangeiros residentes em Portugal tomem medidas proativas e preventivas para garantir que os seus desejos sucessórios sejam respeitados. Uma solução viável é a escolha da lei aplicável à sucessão. Desde a entrada em vigor do Regulamento Sucessório Europeu, os cidadãos dos Estados-Membros da UE, incluindo os estrangeiros residentes em Portugal, têm a opção de escolher a lei da sua nacionalidade para reger a sua sucessão em vez da lei do seu último domicílio.

Para que esta escolha seja válida, deve ser claramente expressa através de testamento, celebrado em Portugal. Esta escolha pode ter um impacto significativo, permitindo, por exemplo, que um cidadão britânico residente em Portugal opte pela aplicação da lei inglesa, que se baseia no princípio da liberdade testamentária, em vez da lei portuguesa.

Escrito por Andreia Morgado Duarte, Associada Sénior da CCA Law Firm – www.cca.law

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