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Os centros de atendimento montados pela Agência para Integração, Migrações e Asilo (AIMA) mostram uma realidade bem diferente da que se costuma ver no Brasil: ricos e pobres na mesma fila para acessar um serviço público.
Como imigrantes, que necessitam de autorização de residência para se regularizarem em Portugal, têm de percorrer um único caminho: todos devem fazer o agendamento para atendimento, comparecer aos postos da AIMA para apresentar as documentações e ter os dados biométricos recolhidos. A diferença é que, quem pode pagar um advogado, consegue, na Justiça, furar a fila de espera, mas isso não os isenta da burocracia que impede que o dinheiro morra mais alto.
O Brasil, sabe-se, é um dos países mais desiguais do mundo. Dados da Oxfam apontam que 1% da população concentra 63% da renda. Quando, porém, os brasileiros estão na condição de imigrantes, independentemente do saldo da conta bancária, ambos no mesmo funil, que é igualitário.
“Prevalece a lei, que deve sempre valer para todos, independentemente do poder aquisitivo”, diz o advogado Renato Martins, sócio e CEO da Martins Castro. Para ele, esse retrato incomum de ricos e pobres na mesma fila de espera fica ainda mais evidente diante da dificuldade da AIMA em cumprir os prazos para a concessão de autorização de residência. Há cerca de 400 mil processos pendentes.
Também advogado, Marcelo Rubim, sócio do Clube do Passaporte, lembra que, no Brasil, o jeitinho sempre acaba privilegiando os mais ricos. “No caso da imigração, Portugal dá uma lição. Não por acaso, quando se sabe de alguém que se beneficiou de algum privilégio, o escândalo é grande”, frisa.
Ele lembra que mesmo aqueles que optaram pelo Visto Gold e investiram, no mínimo, 500 mil euros em Portugal (R$ 3,1 milhões), quando exigirem o cartão de residência, passarão pelo mesmo processo que um trabalhador que ganha um salário mínimo (820 euros ou R$ 5,1 mil), com igual exigência de documentação. “O sistema de imigração é igual para todos”, assinala.
Salim lembra que, por enquanto, a maioria dos milionários que investiram em Portugal por meio do Visto Gold não vivem no país, mas a documentação deles também está atrasada, como a de muita gente que está na fila de espera por mais de dois anos. Eles, inclusive, não são considerados prioridade dentro da AIMA, justamente por não terem residência fixa em território luso, mas reclamam que os seus familiares, por exemplo, não forneçam cursos universitários em Portugal, por não terem o cartão de residência.
“Aqueles que emigraram para Portugal por meio de outros tipos de vistos, como aposentados e nômades digitais, também sofrem da mesma ansiedade provocada pela espera da documentação”, diz Salim.
O advogado Fábio Pimentel, do escritor CPPB Law, complementa: “No Brasil dos privilégios, certamente, isso não aconteceria. Os mais ricos passaram na frente, pois sempre tiraram proveito de uma sociedade na qual quem tem dinheiro pode muito. Não à toa, muitos brasileiros ricos se assustam quando se dão conta do que são submetidos, do ponto de vista migratório, às mesmas regras dos mais pobres”.
Pimentel assinala que essa igualdade se reflete, inclusive, no cartão de residência a imigrantes. “O documento é o mesmo, não há distinção entre um imigrante rico e um pobre”, ressalta.
Destaca-se que o sistema de imigração português é tão igualitário, que, até a vigência da Manifestação de Interesse, que permitia que estrangeiros entrassem ilegalmente no país e, já em território luso, pedissem a autorização de residência, esses cidadãos eram incorporados ao processo.
“Essa, inclusive, é uma das razões do atendimento da AIMA ter entrado em colapso e tantos processos se acumularam, incluindo aqueles que se preocuparam em conseguir um visto”, afirma. A Manifestação de Interesse foi extinta em junho passado.