Segunda-feira, Julho 1

Teve colegas que não comiam, viviam em barracas e alguns chegaram a prostituir-se aos 14 anos. A ele, garante, nunca lhe faltou nada. João Costa cresceu numa família privilegiada mas as desigualdades sempre o incomodaram. Desde cedo que quis ser professor e chegou a ser responsável pela pasta da Educação no Governo do PS. Tempos “duros, foi uma pasta pesada”, recorda.

Cresceu em Setúbal, mas foi em Lisboa que nasceu porque o pai era “alfacinha de gema”. Vivia com os pais, os três irmãos e a avó.

Sempre quis ser professor. Em pequeno, a mãe, professora, levava-o para a escola nas férias de verão e ele ajudava-a a fazer as turmas e a ordenar os nomes por ordem alfabética. “Não gostava de jogar à bola na rua, gostava mais de dicionários”, recorda.

É escuteiro desde os nove anos e o escutismo ainda faz parte da sua vida. Fez teatro e para o Geração 70 trouxe algumas fotografias para recordar esses tempos.

A “miséria” à porta de casa

Nasceu antes do 25 de Abril, em novembro de 1972, mas cresceu numa altura em que a política estava em “todo o lado”. Depois da Revolução, o país ficou “demasiado frágil” e viu a “miséria” à porta de casa.

“Tinha amigos que não tinham casa, viviam em barracas. Tinha duas colegas de turma que aos 14 anos prostituíam-se”.

Os pais tinham carro, gozavam férias no verão e nunca lhes faltou comida à mesa. “Nunca nos faltou nada”, diz João Costa. Cresceu “irritado” com os privilégios que tinha e as desigualdades sempre o incomodaram.

“Ficava muito revoltado porque não percebia o porquê de eu ter e os outros não”.

Um ministro sem passado político

É professor catedrático de Linguística, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Passou da academia para a política sem um “passado político”. Trabalhou no Ministério da Educação oito anos e foi o ministro da Educação do último Governo de António Costa.

Nunca achou que ia ser político. Muito menos ministro. Quando chegou ao cargo, não tinha “ilusões” e sabia que o ministro da Educação não tinha a melhor “fama”. Durante a conversa recorda esses tempos, não muito distantes. Fala das reuniões com os sindicatos dos professores – sempre “cordiais e simpáticas” apesar do que passava cá para fora -, e das dificuldades que teve como ministro.

“O dinheiro nunca chega para tudo e para satisfazer todas as exigências. Tentei mexer nos problemas estruturais do ensino e não consegui porque os sindicatos rejeitaram”, conta.

“Foram tempos duros, foi uma pasta pesada”

Deixou o cargo no final do ano de 2023, depois das buscas à residência oficial do então primeiro-ministro por suspeitas de corrupção. “Hoje tenho mais tempo para sair, pensar, escrever e dizer o que me apetece. Foram tempos duros, foi uma pasta pesada”, conta.

Investigador sobre o papel da escola pública, reflete sobre o que mudou ao longo dos últimos anos. “É mais difícil ser professor”, o tipo de aluno mudou, a “escola deixou de ser das elites” e as atitudes dos pais são outras. “Ser pai não me dá o direito de negar ao meu filho o acesso à informação.

Sobre um assunto que muita polémica causou durante o seu mandato, mantém a mesma posição: “A disciplina de Cidadania pode ser comparada a Português e Matemática, é informação”, sublinha.

“Geração 70“ é uma conversa solta com os protagonistas de hoje que nasceram na década de 70. A geração que está aos comandos do país ou a caminho. Aqui falamos de expectativas e frustrações. De sonhos concretizados e dos que se perderam.

Um retrato na primeira pessoa sobre a indelével passagem do tempo, uma viagem dos anos 70 até aos nossos dias conduzida por Bernardo Ferrão.

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