Quinta-feira, Janeiro 16

A independência de Moçambique é exclusiva e reserva o direito de admissão. Na Praça da Independência, em Maputo, diga-se, a mesma que recebeu na manhã desta quarta-feira a cerimónia de investidura do quinto Presidente da República de Moçambique sob forte aparato de segurança e perante um pequeno grupo de apoiantes, sentado e com cartazes nitidamente feitas nas tipografias do Estado (ou da Frelimo), e (não tão) altas individualidades. Excepção feita a Cyril Ramaphosa, da vizinha África do Sul, e Umaro Sissoco Embaló, da Guiné-Bissau.

Como escreve o site Revista Integrity, “a praça, rodeada de barricadas e supervisionada por um exército de agentes de segurança, parecia mais uma fortaleza do poder do que um espaço público”. Mesmo que uma parte do povo quisesse assistir ao jurar da Constituição do novo chefe de Estado – aquele que votou em Daniel Francisco Chapo e continua a acreditar no projecto da Frelimo –, o protocolo do Estado vedou-lhe a possibilidade de assistir à cerimónia.

Para um Presidente que assistiu no seu discurso os “tempos difíceis”, a fome pela qual muitos moçambicanos passam diariamente e os “níveis preocupados” de desemprego, sobretudo entre os jovens (os mesmos que dão o corpo às balas nos protestos convocados por Venâncio Mondlane );

Para um Presidente que prometeu assumir como “prioridade das prioridades” a estabilidade social e política, que falou em diálogo, harmonia social e construção do bem-estar para todos;

Para um Presidente que se quis dirigir “a cada um dos moçambicanos, não como um Presidente distante”;

O ambiente traiu-o.

Aquela Praça da Independência, situada pelos seus próprios temores numa redoma securitária impenetrável, poderia servir para transmitir inúmeras mensagens, nenhuma delas de proximidade.

Por isso, quando Daniel Chapo falou de uma “uma nova fase”, a fase parecia a mesma só que com outro interveniente, mais alto, muito mais alto que o anterior – e não era disso que se tratava.

A sua investidura na fortaleza daquela praça de Maputo, rodeada pelos VIP do regime, da diplomacia e do partido no poder, lendo um discurso escrito com entraves retóricos (“consolidação da construção de uma nação”?!) aplaudido por meia dezena de membros do “povo” escolhidos a dedo e adestrados para reagir às palavras com uma entusiasmo de fabrico alheio, dava à tal “nova fase” os contornos da velha, da outra: soava a mais do mesmo.

Por isso, quando Daniel Chapo leu “ouvimos as suas vozes”, falando para aqueles que protestaram nas ruas desde 20 de Outubro, a retórica saiu-lhe sem a amplitude sonora desejada.

No ano da graça de 2025, que é o ano da graça dos 50 anos da independência de Moçambique, num país onde os presidentes que chegam reconhecem “os tempos difíceis” e prometem fazer melhor (e acabam por não fazer), a praça selada da Independência não trabalhada como caixa-de-ressonância. Mais parecia o beco escosso onde a Frelimo enfiou as avenidas largas por onde devia passar o homem novo que, ao fim do exercício ininterrupto de meio século de poder, já mostrou que nunca é novo, só estreia camisa.

Samora Machel, Joaquim Chissano, Armando Guebuza, Filipe Nyusi e agora Daniel Chapo sucederam-se por imperioso constitucional. Cinco vezes dez iguais a cinquenta.

Nem Machel Chissano Guebuza de Nyusi geraram o homem novo, nem é novo o rasto que deixou para ser seguido pelo apelido que agora se junta a esse acrónimo presidencial: na lista actualizada dos países mais pobres, Moçambique lá está, no quarto lugar da tabela. Tantos “tempos difíceis” depois.

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