Terça-feira, Outubro 15

De acordo com a polícia de Hong Kong, o esquema de deepfake do grupo começava com uma mensagem de texto de alguém fazendo-se passar por uma mulher atraente

Parecia ser uma mulher bonita e, na mente dos homens de toda a Ásia, as videochamadas em que conversavam confirmavam que o seu recém descoberto amor era real.

A polícia de Hong Kong diz agora que os homens foram vítimas de uma fraude romântica que utilizava inteligência artificial falsa para atrair as suas vítimas e levá-las a desembolsar mais de 46 milhões de dólares.

Numa conferência de imprensa realizada na segunda-feira, a polícia do centro financeiro asiático anunciou a detenção de mais de 25 membros da alegada rede de burlas, que, segundo as autoridades, visava homens de Taiwan a Singapura e até de países mais distantes como a Índia.

Os 21 homens e as seis mulheres foram detidos sob a acusação de conspiração para defraudar, na sequência de uma rusga ao alegado centro de operações do grupo, numa unidade industrial de 4.000 metros quadrados no bairro Hung Hom da cidade.

Com idades compreendidas entre os 21 e os 34 anos, os suspeitos tinham, na sua maioria, um bom nível de formação, sendo muitos deles licenciados em tecnologias e meios de comunicação digitais, alegadamente recrutados pelo grupo depois de terem frequentado universidades locais, informou a polícia. Os suspeitos teriam trabalhado com especialistas em TI no exterior para construir uma plataforma falsa de criptomoeda, onde as vítimas eram coagidas a fazer investimentos, acrescentaram as autoridades.

Deepfakes são composições de vídeo, áudio e outros conteúdos falsos realistas criados com a ajuda de IA. A tecnologia está a ser cada vez mais adotada por uma variedade de maus atores, desde pessoas que pretendem espalhar desinformação convincente a burlões em linha.

Os esquemas de “Pig-butchering” – assim chamados por “engordarem” as vítimas antes de lhes tirarem tudo o que têm – são uma indústria ilícita multimilionária em que os burlões assumem identidades falsas online e passam meses a preparar os seus alvos para os levarem a investir em sites de criptomoedas falsos. Os “deepfakes” são mais uma arma no seu arsenal para tentar convencer os alvos a investir dinheiro.

Normalmente gerido por gangues chinesas do Sudeste Asiático, não é claro até que ponto o crime está difundido em Hong Kong, uma cidade rica onde a polícia há muito que faz campanhas de sensibilização para as fraudes telefónicas, na sequência de vários casos de grande visibilidade em que as vítimas – muitas vezes idosos – relataram perdas bastante elevadas.

Mas a tecnologia de deepfake, cada vez mais realista, fez subir a parada e colocou as autoridades em alerta máximo.

No início deste ano, uma empresa multinacional britânica de design e engenharia em Hong Kong perdeu 25 milhões de dólares (cerca de 23 milhões de euros), depois de um empregado ter sido enganado por burlões que utilizaram tecnologia deepfake para se fazerem passar pelo diretor financeiro e por outros funcionários.

De acordo com a polícia de Hong Kong, o esquema de deepfake do grupo romântico começava normalmente com uma mensagem de texto, na qual o remetente – fazendo-se passar por uma mulher atraente – dizia que tinha adicionado por engano o número errado.

Os alegados burlões iniciavam então um romance online com as suas vítimas, fomentando um sentimento de intimidade até começarem a planear um futuro em conjunto.

O grupo era altamente organizado, dividido em departamentos responsáveis por diferentes etapas do golpe, segundo as autoridades. A equipa chegava a usar um manual de treino para ensinar aos membros como aplicar o golpe, aproveitando-se da “sinceridade e emoção da vítima”, afirmou a polícia, que publicou partes do manual no Facebook.

As etapas eram: conhecer a visão de mundo da vítima para criar uma persona “sob medida”; inventar dificuldades como relacionamentos ou negócios fracassados para “aprofundar a confiança da outra pessoa”; e, por fim, pintar uma “bela visão”, incluindo planos de viagem em conjunto, para pressionar a vítima a investir.

O esquema funcionou durante cerca de um ano antes da polícia receber informações sobre o mesmo por volta de agosto. Mais de 100 telemóveis, o equivalente a cerca de 26.000 dólares em dinheiro e vários relógios de luxo foram recuperados na rusga, segundo a polícia.

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