A referência para a primeira consulta das gémeas não cumpriu os requisitos legais, por ter sido feita, via chamada telefónica, pela secretaria do Estado da Saúde, reforçou António Almeida, técnico de auditoria interna do Hospital Santa Maria, na sua audição na comissão parlamentar de inquérito ao caso.
António Almeida foi responsável pela elaboração do relatório de auditoria interna pedida pelo Conselho de Administração do Hospital Santa Maria, à dados liderado por Ana Paula Martins, atual ministra da Saúde.
Esta quinta-feira, o auditor confirmou, na sede do inquérito, as conclusões a que tinha chegado: a referenciação para a primeira consulta das gémeas foi feita pela secretaria de Estado da Saúde e, por isso mesmo, não cumpriu os requisitos legais definidos na portaria 147/2017, que regula o sistema integrado de gestão do acesso dos utilizadores ao SNS. “A referenciação tem que ter legitimidade clínica”, explicou.
A referenciação foi a única diferença em relação aos 10 casos de crianças com atrofia muscular espinal tratadas em Santa Maria, concluiu a auditoria que avaliou também os processos dessas crianças.
De acordo com o auditor, existiam “indicações claras e objetivas” de que a referenciação tinha sido feita pela Secretaria de Estado da Saúde. Logo no processo clínico das crianças, elaborado por Teresa Moreno, neuropediatra responsável pela gestão do Zolgensma, foi escrito que tinha sido a secretaria de Estado para fazer a referenciação, notou António Almeida.
Uma informação que Teresa Moreno repetiu no seu depoimento aos auditores do Santa Maria e Ana Isabel Lopes, diretora de pediatria do hospital, corroborou. Segundo António Almeida, ambas confirmaram que a secretaria de Estado da Saúde tinha, através de uma chamada telefónica, feito a referenciação das gémeas para a primeira consulta. No entanto, os auditórios não apuraram informação sobre quem partiu o telefonema.
Carla Silva, secretária de António Lacerda Sales, já confirmou que telefonou à diretora de pediatria do hospital para fazer um pedido de marcação de consulta, a pedido do secretário de Estado, mas Lacerda Sales nega esta versão.
António Almeida garantiu ainda que nenhuma das personalidades ouvidas pelos auditores recebeu uma eventual interferência do Presidente da República, da Casa Civil, ou de outro governante. Contudo, o técnico explicou que a auditoria avaliou apenas o sistema de controlo interno de Santa Maria, não tendo estendido a análise às entidades externas ao hospital.
António Almeida conseguiu que, se o Ministério Público e a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde não fizessem inquéritos abertos ao caso, o âmbito das auditorias de Santa Maria pudesse ter sido alargado.