Sábado, Dezembro 21

Moitié-moitié.” Em Friburgo, a metade metade aplica-se ao fondueque é um assunto muito sério neste canto da Suíça: moitié-moitié é um fondue com dois dos queijos que por aqui se produzem, o Gruyère, que quase dispensa apresentações, e o Vacherin. No caso de Jorge Cardoso, moitié-moitié significa que ele tem tantos anos de Portugal como da Suíça.

“Vim para cá com 17, faço 34 daqui a uns dias”, conta às Fugas à mesa do Café des Arcades, próximo da catedral de Friburgo, onde nos sentamos para comer um delicioso Rosti com cogumelos e ovo. Estão então no Café des Arcades dois vareiros, Jorge e a autora destas linhas, pedem um Rosti e começamos a falar de chocolate.

Jorge Cardoso nasceu em Ovar e com 17 anos mudou-se para a Suíça com a família: pai, mãe e irmão. Ainda em Portugal, estudar artes gráficas mas, uma vez chegou aos arredores de Friburgo, a barreira da língua impôs algumas dificuldades. “Comecei então a trabalhar, primeiro a fazer uns trabalhos de jardinagem, depois a servir às mesas num restaurante português”, recorda. E a cozinha, que sempre esteve lá, começou um intrometer-se a sério na sua vida.

“Os meus pais tiveram um restaurante em Portugal. O meu pai é cozinheiro, a minha mãe chegou a vender bolos na praia do Furadouro. Eu próprio fazia muitos bolos com ela em casa.” Fazer uma formação de cozinha, primeiro, e logo depois outra de pastelaria acabou por ser um percurso natural.

“Trabalhei muito, muito. Tive muitas noites brancas, sete sobre sete dias, sem descanso, ao longo de dez anos. Em dez anos acho que trabalhei como se fossem 15”, despendeu Jorge Cardoso. O “enorme esforço” que fez acabou por ser recompensado: já com especialização em chocolate, acabou por ser escolhido por duas vezes, em 2018 e em 2022, para representar a Suíça na Culinary World Cup, uma competição que decorre a cada quatro anos, tendo-se sagrado, em ambas as edições, campeão do mundo na categoria de escultura artística em chocolate.

A trabalhar por conta de outrem, tornou-se assim um dos chocolateiros mais respeitados na Suíça. Até que, em 2021, decidiu arriscar e abriu a sua primeira loja em Friburgo. Fica na Rue de Lausanne, na prática a continuação da Rue de Romont, que é a principal via comercial da cidade. O número 17, entalado entre uma loja de roupa e uma florista (de uma portuguesa, por sinal), tem uma montra discreta, onde se lê Jorge Cardoso Chocolatier – Champion du Monde.

Jorge Cardoso na sua loja de Friburgo
Manoel Roberto

Lá dentro, freiras escassos 24 metros quadrados, sucedem-se prateleiras e prateleiras com as criações de Jorge Cardoso: as mais variadas comprimidosbombons coloridos e apetitosos, amêndoas cobertas de chocolate, tranches de laranja e chocolate negro, esquilos e cogumelos que fazem a montra de outono, abóboras, ovelhas, mochos, cabeças de leões e de dragões, que a criatividade de Jorge não pára. Os preços são muito variados: vão dos 7,90 francos suíços das comprimidos de 75 gramas a 34,90 da cabeça de leão.

“Quase um vício”

A magia acontece no atelier de Jorge Cardoso, nos arredores de Friburgo, onde neste momento com ele trabalha dois jovens rapazes. Quando lá chegamos, por volta das 15h30, a jornada diária está quase a terminar. “Começamos muito cedo, pelas 7h”, explica Jorge. Entramos e damos de caras com uma enorme tempera de chocolate, uma estufa de pintura – “Fui eu que a fiz”, sublinha o chocolateiro –, moldes e mais moldes de silicone alimentar. Estamos em Outubro mas aqui já se trabalha, desde Setembro, para o Natal. Aliás, Jorge já tem bem avançado a estátua de São Nicolau, padroeiro de Friburgo, que vai levar para a porta da loja.

Quando visitámos o atelier de Jorge Cardoso já ele estava a preparar uma escultura de São Nicolau para pôr à porta da loja durante a época festiva
Manoel Roberto

No espaço destinado aos arrumos, dentro de uma caixa, reservado, já meio desmontado, a escultura com que Jorge Cardoso arrematou o título de chocolateiro campeão do mundo em 2022: uma vaca de leiteira às costas, montada numa bicicleta, que consumiu “horas e horas de trabalho”. É também aqui que está guardado o busto do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que Jorge esculpiu. “Ao Presidente Marcelo ofereci, já este ano, um busto mais pequenino.”

A escultura que lhe deu mais notoriedade está no Funchal, no Museu CR7. É, claro, uma escultura de Cristiano Ronaldo em tamanho real: mede 1,87m, a altura do futebolista madeirense, pesa 120 quilos e demorou “300 horas a ser feito”. Em 2022, Jorge Cardoso usou o chocolate para dar forma ao tenista suíço Roger Federer, e, já este ano, por ocasião do Festival de Chocolate de Óbidos, fez um busto de Amália Rodrigues. “A dada altura, fazer estas esculturas torna-se quase um vício”, ri-se.

Em 2026, há nova competição da Copa do Mundo de Culinária e Jorge já foi assediado para representar de novo a Suíça. “Já disse que não. Agora quero focar-me no meu trabalho. No ano passado, abri também uma loja em Lausanne e tenho planos para abrir uma outra. É nisso que estou focado agora”, garante.

A Fugas a convite do Turismo da Suíça

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