Sábado, Janeiro 11

Uma hora antes do início da manifestação agendada pelo movimento “Não nos encostem à parede”, um grupo de activistas de extrema-direita ocupou o lado poente da Alameda, em Lisboa, para onde está agendado o protesto contra a actuação da PSP.

Espaçados, com faixas e grandes bandeiras de Portugal e da sigla partidária, os apoiantes do partido Ergue-te e do movimento Habeas Corpus ocuparam uma área substancial do espaço, levando mesmo um vendedor de livros anarquistas que estava no local a mover-se para um passeio mais afastado. Em silêncio, querem fazer a sua oposição à manifestação contra a atuação da PSP nos locais de grande concentração de imigrantes e na periferia da Grande Lisboa.

Na Praça da Figueira, onde pelas 15h20 se concentravam cerca de três centenas de pessoas, está instalado um enorme palco com quatro bandeiras de Portugal e um ecrã onde se lê o lema da concentração convocada pelo Chega “Pela autoridade, Contra a impunidade”. Está presente um forte dispositivo policial mas de uma forma relativamente discreta: estão estacionadas nove carrinhas da Unidade Especial de Polícia no canto da Praça da Figueira que dá para a praça D. Pedro IV, com os agentes dentro. Nos outros cantos da praça também estão viaturas da PSP e algumas polícias na rua.

A organização está sendo distribuída camisetas pretas também com o lema da concentração e está a preparar-se uma coreografia, segundo anunciou no palco a vice-presidente do partido, a deputada Patrícia Carvalho. Não há bandeiras do partido nem nacionais entre a assistência e apenas um cartaz sobressai entre os muitos casacos pretos dizendo “Je suis polícia”.

Mas, entretanto, os voluntários do partido começaram a distribuir bandeiras portuguesas. Os participantes são obrigados a colocar-se a “um passo de distância”, para encher o espaço. Junto ao palco só podem estar os deputados e dirigentes do partido, e os demais participantes são mandados para trás, assim como quem tem bandeira vai se colocar em torno da massa de gente, para formar um quadrado.

“Para quando o presidente chegar”, diz Patrícia Carvalho, ao ver esta coreografia organizada. Em volta da concentração há alguns imigrantes que vão passando, assim como muitos turistas que até perguntam do que se trata a “festa”, como alguns lhe chamaram, e há também outros parados junto ao pedestal da estátua do rei D. João I.

André Ventura, que chegou ao protesto do Chega pelas 15h30, disse querer deixar “três mensagens no dia de hoje”: “Um, sejam imigrantes ou não, têm que cumprir a lei. Dois, a polícia, se entender, deve fazer operações mais musculadas. E terceiro, precisamos de um país que se preocupe mais com os cidadãos comuns e menos com os bandidos”.

Ventura acusou os partidos da esquerda de “hipocrisia” e de “querem destruir a imagem das forças de segurança”. “Gostava que muitos dos líderes de esquerda chamassem o Batman ou o Super Homem quando estivessem com problemas, em vez de chamarem a polícia. Ou chamem alguém que venha com cravos vermelhos para resolver os assaltos às casas, a violação das namoradas ou dos namorados , os ataques à propriedade”.

O líder do Chega defendeu que independentemente da zona do país, “haja imigrantes ou não haja imigrantes”, deve haver operações policiais. “A polícia tem que agir com firmeza, dentro da lei. Durante muitos anos, os comerciantes que viviam ao pé do crime não tinham representação quando havia manifestações como estas. É como diz o povo português, comiam e calavam. Agora eles sabem que não é assim. Tem que ter rugas, seja na Lapa seja no Martim Moniz. Não pode haver uma operação policial no Martim Moniz só porque é uma zona de imigrantes A PSP não fez uma rusga contra os imigrantes, fez uma rusga contra o crime? .

Ventura disse ainda que o protesto do Chega foi organizado para defender “as vítimas”, as pessoas que “não querem viver ao lado do tráfico de drogas, de assaltos, de crimes com armas brancas”. “A grande maioria da esquerda e, infelizmente, o centro-direita, querem um país em que os criminosos têm os direitos todos”, acusou.

“Não é uma manifestação conta a polícia”

Centenas de pessoas são esperadas esta tarde em Lisboa numa manifestação contra o racismo e xenofobia, denominada “Não nos encostem à parede”, em protesto contra a actuação da polícia na zona do Martim Moniz que viu imigrantes.

Na sequência da intervenção da PSP no dia 19 de Dezembro na rua do Benformoso, perto do Martim Moniz, em Lisboa, e das imagens de bolsas de imigrantes encostadas às paredes dos prédios, para serem revistados por vários activistas de esquerda e uma centena de organizações subscreveram um apelo contra a atuação das forças policiais junto das periferias e dos imigrantes.

Esta tarde, ao ver o aparato do partido de extrema-direita, um casal de idosos comentou à Lusa a tensão existente. “Estes só vêm aqui provocar. Eu nem sou contra ou a favor da polícia, mas estes só estão aqui para provocar”, afirmou Afonso Sousa, reformado da função pública.

Em directo para a RTP e apresentando a manifestação contra o racismo e a xenofobia, Alexandra Leitão, do PS, começou por dizer que o protesto não é “contra ninguém”, mas sim pela “defesa dos valores da democracia e do Estado de Direito”. “Liberdade, igualdade, dignidade da pessoa humana, não-discriminação e também segurança. O Partido Socialista não está aqui contra ninguém, está aqui a defender estes valores, que são o chão comum da nossa democracia, e todos aqueles que se reviem esses valores, que são a base do regime democrático português, devem estar aqui.”

Alexandra Leitão fez questão de sublinhar que esta não é uma manifestação contra a polícia, que se referiu ser uma “instituição fundamental da democracia e do Estado de Direito”. “Por isso mesmo não pode, nem deve, ser instrumentalizado no discurso político, por discursos que dividem, artificiais, que não fazem nada para resolver os problemas dos portugueses. Polícia de proximidade, videovigilância, iluminação pública, isso é que combate a insegurança e não operações que outra têm função”, disse.

Já a coordenadora do BE, Mariana Mortágua, defendeu que o que vários partidos nesta manifestação “é o orgulho do anti-racismo” e “a coragem da solidariedade nos momentos mais difíceis”. “É por isso tão importante estarmos aqui com comunidades de imigrantes, com associações de imigrantes, com outros partidos políticos, com pessoas que se querem juntar nesta celebração”, afirmou.

Questionada sobre a vigília promovida pelo Chega, o líder do BE contrapôs que o centro deste dia deve ser “a capacidade de uma democracia para se unir”, dizendo não querer falar de outros protestos. “O único receio que devemos ter é o receio de ficar calados, em silêncio. É o recibo do medo. Quem tem a coragem da solidariedade, quem tem orgulho nessa posição de união, de antifascismo, de solidariedade, de democracia, não tem recebimento de nada, porque a democracia é tudo o que vale a pena defensor”, afirmou.

Pelo PCP, João Ferreira alertou que a “instrumentalização, por parte do poder político, das forças de segurança é um perigo” para a população, para os próprios agentes e para a democracia. “Quando essa instrumentalização é feita para voltar grupos da população uns contra os outros, mais perigosa se torna ainda, porque hoje é contra uns e amanhã será contra nós todos”, referiu o dirigente do PCP.

O anúncio da manifestação, que teve início pelas 15h junto à Alameda e termina no Martim Moniz, motivou a resposta de grupos da extrema-direita e o partido Chega especificações uma vigília de apoio à PSP na Praça da Figueira para a mesma tarde, denominada “Pela autoridade e contra a impunidade”.

O Ergue-te e elementos do Habeas Corpus optaram por estar presentes na Alameda, no local de partida da manifestação, onde são esperados representantes de todos os partidos da esquerda parlamentar. Para o local procurarem acorrer, de modo discreto, motos e veículos da PSP de modo a criar um perímetro entre os dois grupos. Já os manifestantes do movimento “Não nos costem à parede” optaram por se concentrar um pouco mais abaixo, no limite sul da Alameda com a avenida Almirante Reis. Com Lusa

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