Domingo, Dezembro 29

Como boa geração Z que sou, adoro fazer chamadas em “alta voz”. Como diz Kim Kardashian, é a única forma de garantir que os microbios que estão na tela dos nossos telemóveis não passem para as nossas caras. Além disso, há uma certa piada em poder andar de um lado para o outro dentro de casa com o telefone na mão, poder ainda parar para fazer uma tosta com queijo enquanto oiço ou me visto para sair de casa logo a seguir.

Porém, é neste ponto que começa a surgir um pequeno problema: as minhas amigas de chamadas de longa duração gostam de o fazer também. Aqui surgem os típicos: “O que é que está a fazer?” ou “Tens isto em alta voz? É que as duas não vão dar!” ou o tão mítico “Consegues ouvir?”. Esta pergunta não se aplica apenas a chamadas, já agora. Aplicar-se, também, um conceito em ascensão no mundo jovem: a participação jovem.

De acordo com a UNICEF, esta é definida como todas as oportunidades que as crianças e jovens têm de se fazer ouvir nas tomadas de decisão no seu país em legislação que os afecta directamente, apesar de, para mim, ser muito mais que isso. A participação abrange todos os nossos altos, desde votar a inquéritos submetidos de satisfação: tudo o que é uma forma de expressão é imediatamente uma forma de participação, por mais informal que esta presente.

Agora coloca-se outro fator, tal como nas chamadas. Por vezes, o uso da palavra “ouvir” é redutor daquilo que faz nas nossas interações com os outros. Dizemos que queremos que o outro “oiça”, mas quando dizemos isso já esperamos que ele esteja a compreender, interpretar, formar uma opinião (favoravelmente de acordo com a nossa) e a parte. Isso que queremos é “comunicar”: é uma troca bilateral, é um momento vulnerável, de partilha, nunca queremos que fique apenas pela audição, e é o mesmo no caso de participação.

A sociedade mais jovem é a sociedade do “já” e do “logo”, o ritmo acelerado de vida em que vivemos não permite o contrário. Um dos aspectos que mais nos caracterizamos é o querer ver resultados praticamente imediatos, o que coloca uma barreira a momentos de participação diretamente com órgãos de decisão política.

Como é de conhecimento geral, pôr leis em prática demora, e bastante. Contudo, se queremos motivar uma maior participação cívica, temos de criar algum mecanismo que catalize. Lembro-me sempre bem da minha primeira conferência de alto nível no Conselho da Europa, um dos jovens que também lá estava disse assim: “No meu país, os decisores políticos pedem a nossa opinião e colocam-na numa gaveta para nunca mais a abrir ”.

Portugal não pode entrar neste registo, mas essa é uma realidade que conseguimos facilmente evitar. A nível de iniciativas de participação, Portugal está repleto delas, principalmente focadas para o público jovem, o que é realmente de louvar. Por outro lado, falta a dinâmica das mesmas: criar estes espaços e não mostrar os resultados é uma falha. Acredito que os projetos a longo prazo são sempre a melhor aposta, mas escolher aquele mais fácil e fazê-lo acontecer logo, para mostrar que aquela voz importante, era um passo crucial para ainda melhorar mais. Por isso mesmo, da próxima vez que atenderes uma chamada e te perguntarem se consegues ouvir, pergunta-te se te consegues fazer ouvir no teu país, ou só mesmo à tua volta, porque é isso que vai mudar o mundo, uma chamada de cada vez.

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