Sábado, Outubro 12

Os aficionados pela observação do céu noturno têm tido, nos últimos tempos, várias ‘surpresas’ no que diz respeito a fenómenos vistos a olho nu. É o caso das auroras boreais que têm sido observadas um pouco por todo o mundo – e também em Portugal.

 

Partilhadas nas redes sociais, as imagens das auroras boreais têm encantado os portugueses, com o fenómeno a exibir tons rosados que nem sempre são associados a estes acontecimentos.

O Notícias ao Minuto decidiu então falar com Teresa Barata, investigadora do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço da Universidade de Coimbra, que explicou a origem destes fenómenos e porque se tornaram (aparentemente) mais frequentes nos últimos tempos.

Estamos a ver auroras nas nossas latitudes porque o Sol está com uma atividade mais forte relativamente ao ciclo anterior

© UC  

Nos últimos tempos temos visto cada vez mais situações e relatos de aparecimentos mais frequentes de auroras boreais, muitas vezes em regiões onde tal não é habitual. Qual é o motivo?

Estes fenómenos não estão a acontecer mais agora por alguma razão em particular. Sempre existiram ao longo do tempo. Há alturas em que a atividade solar está mais intensa, mais forte, e pode provocar estes fenómenos mais frequentemente. É este o caso. Há registos de auroras em Portugal no início do século passado, mas são fenómenos vistos por algumas vezes. Está relacionado com o comportamento da Terra a essa atividade solar, o que sempre existiu.

Simplesmente, agora vemos mais este efeito porque estamos a olhar mais para o céu, por causa da tecnologia e porque têm sido frequentes neste ciclo solar. No ciclo passado não houve auroras boreais significativas nestas latitudes (designadas como médias latitudes), porque nas latitudes mais altas sempre existiu – onde até existe um tipo de turismo assente na observação destes fenómenos.

Neste ciclo estamos a ver auroras nas nossas latitudes porque o Sol está com uma atividade mais forte relativamente ao ciclo anterior.

Não tem risco a nível de saúde humana, mas provoca perigos na medida em que usamos a tecnologia

Houve uma tempestade geomagnética nas últimas semanas, certo?

Sim, foi esta semana. Começou no dia 8, houve uma Ejeção de Massa Coronal (ou CME) que atingiu a Terra. As explosões solares são fenómenos difíceis de prever e transportam eletrões e protões. Através desse transporte, que os sensores conseguem medir, conseguimos perceber se haverá fenómenos mais fortes na Terra e se representam algum perigo para a tecnologia na Terra. E aconteceu esta quinta-feira, dia 10.

Nós temos um campo magnético em volta da Terra, que nos protege e reage à atividade solar. Nessa ‘proteção’, acontece uma reação que provoca tempestades geomagnéticas e é nessa altura que observamos as auroras.

Mencionou perigos para a tecnologia. Que tipo de perigos? Há riscos para a população?

Não tem risco a nível de saúde humana, mas provoca perigos na medida em que usamos a tecnologia. É por isso que também estamos mais despertos a este tipo de fenómenos – como as auroras – porque a nossa tecnologia está também mais dependente de tecnologia espacial, dos satélites de telecomunicações, mais especificamente, que não têm um campo magnético a protegê-los como acontece com a Terra.

Os satélites são afetados primeiro e os astronautas também. Aí sim, há perigo porque se estiverem no Espaço estão expostos a radiação. Mas todas as tecnologias que dependem de satélites acabam por ser afetadas, como é o caso dos GPS’s, comunicações, aviação, explorações petrolíferas ‘off-shore’… É por isso que estamos mais cientes dos perigos que podem acontecer.

Nas redes elétricas sempre aconteceu. Ao interagir com a atividade solar, o nosso campo magnético sofre correntes induzidas e por isso também há problemas com as redes elétricas. Ao estarmos mais dependentes de tecnologia de ponta, também estamos a ficar mais vulneráveis a este tipo de situações que sempre ocorreram. 

O Evento Carrington de 1859, por exemplo – que tem o nome do astrónomo que observou as manchas solares que deram origem a esse tempestade – resultou numa série de auroras e na altura ‘deu cabo’ do telégrafo, que eram as comunicações da altura. Um evento dessa natureza, neste momento, seria muito mais catastróficos para a nossa sociedade em termos tecnológicos.

As condições ideais para se observar este tipo de fenómeno é um céu noturno limpo, não só de nuvens, mas também de poluição luminosa

E há alguma forma de contornar este tipo de situação?

O que os cientistas estão a fazer é criar centros de previsão e de alertas, com o mais importante a ser o National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) dos EUA. O que estamos a tentar fazer neste momento é melhorar os modelos de previsão e melhorar a observação solar em permanência de forma a avisar os responsáveis por tecnologias que sejam mais vulneráveis, para que possam tomar medidas de prevenção.

Estes modelos estão cada vez melhores e há um grande investimento nisso, mas não é fácil porque da parte dos sectores económicos esta mensagem nem sempre passa.

O sector da aviação, por exemplo, está bem ciente deste problema porque afeta rotas polares e têm de ser desviadas do Polo Norte. Começou a haver mais rotas polares entre a América do Norte e a Ásia por uma questão de custo e diminuir o tempo de voo, mas acontece que quando há este tipo de problemas essas rotas são desviadas para prevenir problemas nas comunicações. Não representa o perigo de um avião cair. Mas os outros sectores económicos não estão cientes desta questão, que também passa pela comunicação dos cientistas e dos políticos.

Estes fenómenos não são tão fortes nas nossas latitudes. Se estivéssemos mais a norte, estaríamos muito mais cientes deste tipo de fenómenos.

Quanto maior for a tempestade magnética, é evidente que é mais fácil de se verem auroras em latitudes médias. Em Lisboa, no entanto, não se verá por uma razão muito simples: a poluição luminosa

Que tipo de condições é que deve ter uma explosão solar para que sejam vistas auroras em latitudes médias, mais a sul? Tem de ser mais violenta?

Não tem de ser particularmente violenta. Quanto maior for a tempestade magnética, é evidente que é mais fácil de se verem auroras em latitudes médias. Em Lisboa, no entanto, não se verá por uma razão muito simples: a poluição luminosa.

As condições ideais para se observar este tipo de fenómeno é um céu noturno limpo, não só de nuvens, mas também de poluição luminosa. Além disso, quanto mais a norte estivermos, mais observável será este fenómeno.

Sobre as auroras especificamente, as fotografias mostram este fenómeno com diferentes tonalidades – verde e rosa. São tipos diferentes de auroras ou é só uma cor que muda? Porquê a diferença na cor?

Tem a ver com as camadas na atmosfera que são ionizadas, com os átomos. No caso de médias latitudes, as camadas que estão sujeitas à energia da radiação são as mais baixas da atmosfera – o que provoca os tons mais rosados. No caso das latitudes mais a norte, é mais o topo da atmosfera e que confere aqueles tons verdes e com um ‘baile’ de cores mais exuberantes

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