Quarta-feira, Janeiro 15

Quantas pessoas disseram que “não” a António Costa durante os oito anos em que o ex-primeiro-ministro geriu o partido com mão-de-ferro? Poucas, muito poucas. António Costa não gostou que ele dissessem que não a maioria dos ministros agia em conformidade, segundo rezam as crónicas informais do Conselho de Ministros.

Alexandra Leitão está determinada – ela também se autodefine assim – e não veio para a política para servir chá, bolos e sorrisos.

Se Costa não gostasse de homens que o enfrentassem, não iria gostar que uma mulher o fizesse. Afastou Alexandra Leitão do Governo que passou a seguir à maioria absoluta, mas ofereceu-lhe o lugar de líder da bancada parlamentar. A ex-ministra da Modernização Administrativa decidiu e tornou-se pública essa recusa.

À Lusa, a 22 de Março de 2022, disse: “A principal razão é considerar que o meu perfil é mais executivo, é nesse perfil que seria mais útil ao partido e ao governo”. Na época, Alexandra Leitão nunca tinha exercido a carga de deputada e achou o convite de Costa “surpreendente” e que “não faria sentido aceitar”. Acabaria a aceitar a carga noutras circunstâncias, já com Pedro Nuno Santos como líder do partido e o PS na oposição.

Apesar de ter se filiado ao JS no tempo da universidade, em 1991 – onde foi contemporâneo do antigo líder da Juventude Socialista Sérgio Sousa Pinto e também do seu marido, o professor João Miranda – Alexandra Leitão dedicou grande parte dos últimos anos à carreira acadêmica. Mas é filiada no PS desde 1995.

Foi em 2015, no primeiro Governo Costa, enquanto secretária de Estado Adjunta e da Educação, que começou a ficar conhecida do grande público. Já era, na altura, professora auxiliar na Faculdade de Direito de Lisboa e tinha tido uma breve passagem pelo Governo, entre 1997 e 1999, como adjunto do gabinete do secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Vitalino Canas.

Natural de Lisboa, foi cabeça-de-lista por Santarém nas últimas legislativas e também nas anteriores – Pedro Nuno Santos, quando elaborou as listas de deputados, preferiu dar a Mariana Vieira da Silva o lugar de número 1 por Lisboa.

A “determinação” e a capacidade oratória de Alexandra Leitão são populares fora do PS, mas nem sempre muito bem vistas pelos seus camaradas, nomeadamente pelos homens. O antigo deputado Ascenso Simões escreveu no Expresso um texto em que dá conta de algum sentimento “pró Alexandra, anti-Alexandra” que atravessa o PS: “As reações à indicação do líder do PS são muito radicais nas bases, quase passionais. Entre os que dão como perdidas as eleições tendo em conta o histórico e os que acham que a candidatura é mobilizadora. Eu fico-me pela esperança que podemos ter”.

Se um líder é sempre alguém que suscita reações apaixonadas, Alexandra já alcançou esse estatuto. Tem coragem nos momentos difíceis: foi o primeiro dirigente do PS a opor-se à aprovação de Ricardo Leão da moção do Chega que prevê que os condenados por violência nas ruas sejam despejados de habitações municipais. O aparelho de Lisboa, na sua maior parte fã de Ricardo Leão, não gostou.

Mas Alexandra não exclui que, num futuro pós Pedro Nuno, venha ao poder ser secretária-geral do PS. Seria a primeira mulher a assumir esse cargo num partido que é o único, entre os fundadores da democracia, que nunca teve uma liderança feminina. Numa entrevista ao PÚBLICO em 2023, quando tinha sido encarregue de elaborar a moção ao congresso de Pedro Nuno Santos, à pergunta sobre se algo corresse mal a Pedro Nuno se via a candidatar-se a secretária-geral, respondeu assim: “Neste momento estou muito empenhada na candidatura do Pedro Nuno Santos, na qual me revejo muito. E volto a dizer: acho que nós, mulheres, não devemos nunca excluir, porque durante muito tempo acabámos também por ficar fora dos lugares por modéstia, porque não nos chegámos à frente”.

Alexandra luta contra essa “modéstia” que auto-sabota a ascensão das mulheres na política. E admitiu que sim, que “é uma hipótese” no futuro candidatar-se a líder. “Neste momento estou completamente com a candidatura de Pedro Nuno Santos. No futuro… Acho que ainda tenho uns anos à minha frente de vida política e, portanto, veremos. É uma hipótese”.

Pedro Nuno Santos justificou esta terça-feira ter escolhido Alexandra Leitão pela sua “determinação” e “capacidade de realização”. E assumiu, pela primeira vez: “Depois de mim, Alexandra Leitão é a figura mais importante do PS”. No fundo, disse o que já toda a gente sabia – Alexandra Leitão é a número 2 do Partido Socialista. A carga já existia de facto, mas não de direito. Passou a existir.

Compartilhar
Exit mobile version