Ano novo, planos novos. Depois de um 2024 de atrasos em matéria climática, o ano de 2025 traz esperanças renovadas — e uma agenda já recheada. O Azul selecionou como principais assuntos a acompanhar em 2025 em matéria de acção climática e ambiental, em Portugal e no mundo.
Cimeira do clima e pontas soltas
A assinatura do Acordo de Pariso tratado que mudou o rumo da ação climática global, completa dez anos em dezembro de 2025. A celebração terá lugar na COP30, a cimeira do clima das Nações Unidas que terá lugar em Belém, no Brasil — na porta de entrada da Amazônia —, com um foco especial na relação entre o clima e a natureza. Até lá, os países ainda terão que entregar os seus planos de acção climática (contribuições nacionalmente determinadas, ou NDC), mas já se espera que vários deixem escapar do prazo de 10 de Fevereiro. Quem não se atrasou foi a administração de Joe Biden, com os EUA a submeterem-se a sua NDC antes da tomada de posse de Donald Trump, que já prometeu voltar a retirar o país do Acordo de Paris.
O novo ano abriu oportunidade para fechar dois dossiês importantes que ficaram pendentes. A COP16 da Biodiversidadeque foi suspensa abruptamente em Novembro antes de ver aprovada uma decisão sobre financiamento, será retomada no final de Fevereiro, em Roma. O futuro tratado global para reduzir a poluição por plásticoscuja última rodada de negociações, em dezembro, não foi suficiente para chegar a um acordo, deverá ter um novo encontro no final da Primavera.
Em espera continua o Acordo para a Conservação e Utilização Sustentável da Biodiversidade Marinha para além da Jurisdição Nacional (BBNJ), também conhecido como Tratado do Alto-Mar, que precisa de ser ratificado por pelo menos 60 países para entrar em vigor. Portugal foi um dos primeiros países que aprovaram o tratado, mas até hoje ainda não o ratificou; o mesmo para a União Europeia. Fica por saber se o esforço diplomático acontecerá no ritmo da 3.ª Conferência das Nações Unidas sobre Oceanos, que terá lugar em Nice, França, em Junho.
Agência para o Clima
A nova Agência para o Clima (ApC) iniciou funções a 1 de Janeiro e será o grande organismo para a acção climática, integrando os funcionários da (agora extinta) Secretaria-Geral do Ministério do Ambiente e da divisão de Clima da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), num total de 120 a 130 funcionários.
A ApC vai gerir os vários fundos relacionados com a acção climática, como o Fundo Ambiental e em breve o Fundo Social para o Clima (FSC), que vai financiar dois projectos-piloto em 2025 tendo como prioridade a situação em situação de pobreza energética. O lançamento a nível europeu decorre em Julho de 2026 — nessa altura, o sistema já estará mais oleado e as candidaturas ao FSC deverão passar pelas juntas de freguesia e por instituições de solidariedade social.
Água que uma
O grupo de trabalho Água que Une, uma iniciativa do Governo para criar uma estratégia para a gestão eficiente da água, já tem pronto o seu estudo, que será apresentado no início de Janeiro. Em Novembro, o PÚBLICO noticiou que o Governo tem entre os seus “cenários de trabalho” um grande plano de intervenção em barragens para prevenir cheias e secas, que implicaria a construção de três novas barragens, no Baixo Vouga, no Mondego e em Alportel, mas que afirmou imediatamente as críticas dos especialistas. A associação ambientalista Zero já veio alertar para a necessidade de uma avaliação estratégica ambiental da proposta.
Num encontro informal com jornalistas, em Dezembro, a ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, falou na necessidade de “grandes incentivos” à reutilização da água, à redução do consumo e em particular à redução do desperdício, incluindo as perdas ao longo da rede, tendo em conta que Portugal não tem muita mais capacidade para aumentar a “utilização socioeconómica da água”.
Proteção da natureza
Numa das apostas do Plano Nacional de Restauro da Natureza, o Governo deverá continuar o trabalho de renaturalização de rios. O plano inicial era chegar aos 500 quilómetros de cursos naturais restaurados, uma meta que foi ultrapassada — já são 540 quilómetros recuperados —, mas o Governo quer fazer “muito mais”, diz a ministra.
O início do ano deverá trazer uma criação de novas áreas marinhas protegidas em Cascais, Sintra e Mafra, assim como, finalmente, os planos de gestão das actuais áreas protegidas: 31 planos de gestão serão aprovados já no primeiro semestre, garantidos pela ministra Graça Carvalho, com outros tantos ainda em desenvolvimento.
Entre os eventuais retrocessos a ter em atenção está a proposta de alteração do regime de protecção da Reserva Natural das Ilhas Selvagens, na Madeira, reduzindo a área protegida de 12 para duas milhas náuticas e abrindo a pesca ao atum.
Solos, florestas e renováveis
Até ao início de Fevereiro, espera-se a publicação do plano de intervenção para a floresta, que está a ser preparado por um grupo de trabalho que junta especialistas das áreas de coesão territorial, justiça, ambiente e agricultura.
Também em Fevereiro entram em vigor as mudanças à Lei dos Solos, que viram alterações ao regime de reclassificação do solo rústico para solo urbano para agilizar processos e promover a construção de habitação acessível. Vários investigadores e organizações ambientalistas já chamaram a atenção para a necessidade de protecção do solo rústico que abrange a Reserva Agrícola Nacional ou a Reserva Ecológica Nacional.
Em 2024, o Governo decidiu avançar para uma avaliação estratégica ambiental das áreas de avaliação de energias renováveisque deverá ter desenvolvimentos. Entretanto, como sublinha a associação Zero, espera-se que a Estrutura de Missão para o Licenciamento de Projectos de Energias Renováveis atue em áreas como a promoção da energia solar descentralizada, apoiando comunidades energéticas.
Resíduos
A partir de Janeiro, os municípios deverão iniciar a coleta seletiva para três novos tipos de resíduos urbanos: têxteis, pequenas quantidades de resíduos perigosos e ainda resíduos de mobiliário e outros objetos volumosos.
Além da operacionalização da coleta e reciclagem de roupa usada, falta ainda estimular a coleta de biorresíduos, que continua aquém do esperado, e avança com o sistema de depósito e envio para embalagens de plástico e metal. Em Julho, deverá entrar também em vigor a obrigatoriedade de ser disponibilizada uma alternativa reciclável aos clientes dos serviços de remover.
Numa altura em que Portugal continua longe das metas europeias e deposita grande parte dos resíduos urbanos em aterros sanitários, a ministra adianta que o Governo vai apresentar um plano de atuação para a área dos resíduos, que envolverá uma grande campanha de sensibilização. Maria da Graça Carvalho garantiu que o Governo não planeia criar novos aterros, mas suportar estudar a partilha de aterros e aumentar a capacidade. O fundamental, afirma, é reduzir a produção de resíduos.
Encruzilhada Europeia
Na União Europeia, os planos climáticos que serão entregues pelos 27 Estados-membros antes da COP30 estão dependentes da meta europeia de redução de emissões até 2040, que falta oficializar. O comissário europeu para a acção climática, Wopke Hoekstra, já garantiu que irá seguir a recomendação do conselho científico da UE e propor uma redução dos gases com efeito de estufa em 90% em relação aos valores de 1990. Aguarda-se também notícias sobre o sucessor do Pacto Ecológico Europeu, a estratégia de crescimento verde da Comissão Europeia lançada em 2019 que se espera que seja renovada.
A UE decidiu adiar por um ano a entrada em vigor da lei contra a desflorestação, mas há outras leis que as empresas terão mesmo que cumprir. Uma das mais estratégicas poderá ser uma diretiva sobre o relato de sustentabilidade das empresas (CSRD, na sigla em inglês), que se aplica pela primeira vez às empresas cotadas em bolsa com mais de 500 funcionários nos relatórios e contas sobre o ano fiscal de 2024. Ou seja, nos relatórios que serão conhecidos no primeiro trimestre de 2025, as informações sobre matéria ambiental, social e de governança passarão a ser obrigatórias e têm que seguir critérios padronizados — sem lavagem verde —, incluindo informações fidedignas sobre as suas cadeias de valor.
Justiça climática
Nos tribunais internacionais, espera-se duas grandes decisões em matéria climática. A primeira deverá vir do Tribunal Interamericano de Direitos Humanos, que reuniu amostras de países e entidades para responder às 20 perguntas por iniciativa da Colômbia e do Chile sobre os deveres dos Estados da região para proteger os direitos humanos em contexto de crise climática.
Segue-se a decisão do Tribunal Internacional de Justiça, o grande tribunal das Nações Unidas, sobre o pedido de parecer consultivo sobre as obrigações dos Estados em matéria de acção climática. Em dezembro, o TIJ obteve um número recorde de 100 países — incluindo Portugal — que apreciou os seus comentários perante os juízes.
Em Portugal, deverá ser conhecida a nova decisão do processo movido pela associação Último Recurso, a Quercus e o Zero contra o Estado pelo cumprimento da Lei de Bases do Clima. Em setembro de 2024, o Supremo Tribunal de Justiça deu razão às organizações ambientalistas e, depois de pedir alguns esclarecimentos, solicitou ao tribunal de primeira instância para voltar a analisar o processo.
Ativismos
O movimento Fim ao Fóssil entregou ao Governo uma carta a exigir que o executivo se comprometesse com um plano para acabar com a queima de combustíveis fósseis até 2030. Caso o Governo não se comprometa com a reivindicação até ao final de Abril de 2025, as centenas de estudantes que subscrevem a carta prometem iniciar um período de duas semanas de paralisação das escolas por todo o país, como já aconteceu em protestos anteriores.
Há alguma expectativa sobre as respostas do Governo à oposição das populações à exploração mineira em zonas ricas em biodiversidade, como aconteceu no caso da mina de lítio de Covas do Barroso.
O ano de 2025 também será decisivo para compreender como irá evoluir a pressão sobre os activistas ambientais e climáticos, que já têm chamado a atenção de várias organizações de protecção dos direitos humanos.