Domingo, Outubro 27

Político de 40 anos foi um dos fundadores do Podemos. E era, hoje, o porta-voz da plataforma de esquerdas Sumar

Poderá não ser talvez mediático como Pablo Iglesias, que com ele fundaria o Podemos, em 2014. A ausência de mediatismo também evitou que, ao contrário de Iglesias, sofresse desgaste político.

Íñigo Errejón pairava como um príncipe — talvez por ser jovial no rosto mesmo tendo 40 anos.

À esquerda — à esquerda da esquerda e na esquerda-centrista —, reconheciam-lhe uma oratória atrativa e a capacidade de produzir políticas e de executar políticas, reconheciam-lhe possibilidades e equilíbrios — aguerrido que era, mas não confrontativo — na cada vez mais partida organização política espanhola. 

Ao contrário de Calisto Elói, de “A Queda dum Anjo”, de Camilo Castelo Branco, Íñigo nunca defendeu valores tradicionais — nem se lhe conhece fidalguia, mesmo tendo alguns tiques neoliberais —, antes defendia lutas feministas, anti-racistas, de progresso. No entanto, como Elói — quanto ao ser devasso — acabou caído em desgraça. Deixemos a literatura: a devassidão (sexual e moral) do espanhol é maior e bem mais grave que a do português.

Errejón foi esta semana acusado de assédio sexual, não por uma, mas por já três mulheres diferentes.

A primeira é jornalista, Cristina Fallarás, que descreve o político como “abusador psicológico” e “verdadeiro monstro”. Só num segundo momento Fallarás identificou aquele que tratava por “político muito conhecido” de Madrid. Também Elisa Mouliaá, atriz, apresentadora, apresentou queixa formal, denunciando toques e beijos não consentidos numa festa onde se cruzavam, em 2021.

A terceira denunciante permanece anónima, foi até quem das três falou primeiro, há quase um ano, através das redes sociais, tendo apagado essa denúncia após pressão de Loreto Arenillas, deputada do Más Madrid e antiga chefe de gabinete de Errejón. Arenillas, de 31 anos, é uma proeminente feminista espanhola e “especialista em violências machistas”. 

No final da semana, Errejón, fundador do Podemos, também do Más Madrid e porta-voz da plataforma de esquerdas Sumar, fez mais que demitir-se: afastou-se da política sem volta. No entanto, e admitindo muitas falhas de carácter, nunca admitiu culpa.

Em comunicado, o político madrileno diz ser uma “contradição” — o homem e a figura pública, ou “personagem” —, que mantém um “modo de vida neoliberal” mas é um “porta-voz de um partido que defende um mundo novo, mais justo, mais humano”. Íñigo Errejón admite ter mantido uma “postura muitas vezes emancipada do cuidado, da empatia e das necessidades dos outros”, admitindo igualmente ter gerado uma “subjectividade tóxica” e “patriarcal”.

Dito isto, nenhuma referência concreta há ao assédio sexual, nenhum pedido de desculpa às alegadas vítimas, ainda que muitos leiam nas entrelinhas uma assunção da culpa. 

Afastado da política, a política não perdoou. A líder do Sumar, e vice-presente Governo espanhol, deixou cair o seu delfim e confirmou que começou “um processo de recolha de informação quanto aos testemunhos que têm surgido”. O partido de Errejón, o Más Madrid, prometeu avaliar denuncias e a ministra da Saúde, Mónica García, daquele partido, expressou “profundo pesar, preocupação e apoio a todas as vítimas”, rematando: “Estamos cansadas, todos os casos têm de ser revelados”. Por sua vez, o PSOE de Pedro Sánchez, mas através do secretário-geral Juan Lobato, defendeu que se existem “indícios” de algum crime, “como parece acontecer”, as denúncia contra Íñigo Errejón “têm de ser feitas imediatamente”. 

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