Quarta-feira, Outubro 9

Os incêndios que devastaram áreas florestais e reduziram empresas e casas a cinzas, em 2017 e 2024, repetem-se com uma frequência assustadora. São cíclicos, alimentados por alterações climáticas e exigem uma resposta urgente e eficaz. A questão não é “se”, mas “quando” e “como” iremos enfrentar novamente estes dias negros.

Já todos percebemos que os investimentos realizados em medidas preventivas, como faixas de contenção e limpezas de terrenos, não são suficientes em situações extremas como as que já vivemos. Quando o fogo acaba por atingir mais de 100 focos num só dia e se propaga a velocidades assustadoras, percebemos que ficamos reféns quase exclusivamente de uma mudança nas condições meteorológicas para travar a catástrofe.

Acaba por haver uma perda irreparável de vidas humanas, danos materiais na ordem de centenas de milhões de euros, degradação ambiental, destruição do potencial florestal e menos capacidade de absorção de dióxido de carbono. Uma destruição massiva, que afeta a economia e o meio ambiente de forma devastadora.

Contas simples: se quisermos admitir, por baixo, que a produtividade de um hectare de floresta anual é, em média, 5m3 de material lenhoso, facilmente concluímos que ao queimarem-se cem mil hectares de floresta, se perderam quinhentos mil m3 de madeira nestes últimos incêndios, com um valor médio de 25€/m3 na floresta. Assim, o que se perdeu, apenas este ano, é um valor de 12,5 milhões de euros em material lenhoso. Mais crítico ainda, embora não quantificada, é a perda de absorção de dióxido de carbono. Estudos indicam que cada tonelada de madeira utilizada na construção pode armazenar até uma tonelada de dióxido de carbono. Isto acontece porque, durante o crescimento, as árvores absorvem CO2 da atmosfera através da fotossíntese. Neste processo, as árvores captam o dióxido de carbono do ar e utilizam-no para formar o seu tecido lenhoso, armazenando o carbono nas suas células. Quando a madeira é usada na construção, esse carbono fica retido, em vez de ser libertado novamente para a atmosfera, ajudando a reduzir os níveis de CO2. Assim, é fácil perceber que deixámos de absorver 500 mil toneladas de CO2 e que, com a queima das florestas, ainda foram libertadas enormes quantidades adicionais.

É crucial que façamos uma avaliação rigorosa do que tem sido feito até agora para prevenir os incêndios. As faixas de contenção, por exemplo, têm-se mostrado ineficazes em condições adversas. E, apesar de ser comum apontar o eucalipto como o grande vilão, a verdade é que, quando o fogo atinge proporções descontroladas, tudo arde: eucaliptos, pinheiros, matos, urzes… Não há espécie que resista ao impacto de um fogo movido por ventos imprevisíveis e devastadores. Cresci numa aldeia que há 60 anos só tinha pinheiros. Hoje, só há eucaliptos, nem um único pinheiro. Os incêndios ocorrem em ciclos de 12 a 14 anos e nenhum pinhal consegue resistir. Investir em pinheiros ou noutras espécies torna-se, infelizmente, uma perda total a cada novo ciclo de fogo.

A floresta tem de ser salva pela economia, pelos consumidores e pelos contribuintes que todos somos. A criação de um fundo florestal, alimentado por taxas sobre produtos que utilizam madeira e pelo contributo dos produtores florestais é uma solução que permitirá financiar investimentos massivos na gestão e proteção das florestas. Precisamos de um serviço florestal eficiente, de uma rede de acessos e corta-fogos bem planeados, de um maior investimento em ciência e tecnologia e, sobretudo, de meios robustos para combater os incêndios em condições extremas.

Todos os anos, perdemos centenas de milhares de metros cúbicos de madeira, com prejuízos que atingem milhões de euros. E, mais importante ainda, deixamos de absorver milhares de toneladas de dióxido de carbono, agravando a crise climática. O ciclo é vicioso: as alterações climáticas aumentam o risco de incêndios, que por sua vez aceleram a degradação do ambiente.

A floresta é um bem precioso, que sustenta ecossistemas, fixa dióxido de carbono e gera valor económico. A questão que se coloca é: faremos os investimentos necessários para a proteger, ou continuaremos a correr atrás do prejuízo enquanto ela arde diante dos nossos olhos?

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